É a música como instrumento de exaltação da graça, do poder e dos atributos do Criador
Por Patricia Scott
No ambiente evangélico, o louvor está bastante enraizado. O termo significa, conforme o dicionário, celebração ou manifestação honrosa; homenagem, louvação. Já em “O Novo Dicionário da Bíblia”, a expressão tem relação com as palavras hebraicas halal, yadha e zamar, que são associadas à alegria manifesta diante de Deus, de diversas formas: cantos, gestos, instrumentos.
O pastor Paulo Davi e Silva, do Ministério de Artes e Adoração da Primeira Igreja Batista de Curitiba (PR), esclarece que o louvor existe somente com um único propósito: exaltar a Deus pelos Seus atributos e pelas Suas realizações. Para reforçar, ele cita Salmos 150.1-6:
Louvai ao Senhor! Louvai a Deus no seu santuário; louvai-o no firmamento do seu poder. Louvai-o pelos seus atos poderosos; louvai-o conforme a excelência da sua grandeza. Louvai-o com o som de trombeta; louvai-o com o saltério e a harpa. Louvai-o com o adufe e a flauta; louvai-o com instrumento de cordas e com flautas. Louvai-o com os címbalos sonoros; louvai-o com címbalos altissonantes. Tudo quanto tem fôlego louve ao Senhor. Louvai ao Senhor!
Assim, ele diz que, de Gênesis a Apocalipse, a Palavra de Deus aponta para várias ferramentas de louvor ao Senhor, sempre com o intuído de glorificá-Lo. “A música pode ser um desses meios, como a oração, o testemunho ou uma reflexão”, ressalta, observando que é importante deixar claro que o louvor é eterno. “Já existia antes da criação e da fundação do mundo [Gn 4.3-7; 8.20,21; 12.7; Mt 26.27-30; Ap 5.9-14; 21.22-24; Is 6.3,4 e Jó 38.4-7]”, enfatiza o professor do curso de Teologia com ênfase em Louvor e Adoração da Faculdade Batista do Paraná (Fabapar).
O pastor Paulo Davi explica ainda que o louvor foi instituído na liturgia do culto a partir do reinado de Davi [2 Cr 29.25]. As Sagradas Escrituras revelam que existia uma organização para que o louvor fosse meio de adoração ao Senhor. “Havia aqueles que eram separados para compor aquele momento, conforme a competência e o talento de cada um” [1 Cr 6.31,32].
Já no Novo Testamento, de acordo com o compositor e teólogo Ivan Cláudio Borges, há poucas menções explícitas ao louvor. No entanto, o apóstolo Paulo incentiva “a vida comunitária da igreja a entoar hinos e cânticos espirituais [1 Co 14.15,26; Ef 5.19; Cl 3.16], além de ter pensamentos e ações práticas cristãs na vida pessoal, na família e na comunidade”.
Estado espiritual
Independentemente da época, Ivan pontua que o louvor é tão importante quanto a mensagem pregada. Isto porque anuncia a Palavra de Deus, ou o que dela se interpreta, por meio de melodias que inspiram a adoração, o perdão, o serviço e o comprometimento do povo de Deus. Por isso, a igreja dedicada a desenvolver o ministério de louvor deve ser “organizada a partir do cultivo da oração, da adoração entre os membros da equipe, em um processo de espiritualização da vida particular e coletiva de cada um”, opina o autor da música “Calmo, Sereno e Tranquilo”, um cântico gravado pelo Grupo Logos e bastante conhecido no meio evangélico, que faz parte da história da fonografia evangélica.
Desse modo, Ivan observa que o louvor não é apresentação de um grupo musical ou de um coral, mas um estado espiritual de consciência da presença de Deus. “A musicalidade é apenas uma faceta de como expressamos nosso encantamento pela misericórdia, graça, salvação e a pessoa do nosso Deus”, assevera e emenda: “A estrutura física ou administrativa é de pouca importância. Já o preparo da vida com Deus é fundamental. Sem isso não há louvor, não há convite ao louvor, não há apelo”.
A partir desse contexto, Ivan considera que os desafios de um ministério de louvor são, principalmente, espirituais. “Satanás atua nas pessoas que se dedicam à musicalidade na igreja. A canção repleta de louvor leva à mensagem da salvação, e o Espírito Santo age poderosamente na vida das pessoas preparando-as para a pregação”, analisa. “O grande desafio é incentivar as pessoas do grupo de louvor e do coral a terem uma vida consagrada, de oração, jejum e estudo da Palavra”, ele afirma.
Participação congregacional
De volta à Palavra de Deus, o multi-instrumentista Bené Gomes aponta que o gospel pode ser considerado a música do Novo Testamento, já que a palavra, embora venha da língua inglesa, tem origem grega e traduzida para o português significa “Boas Notícias” ou mesmo “Evangelho”.
“Desde a inauguração da igreja em Atos 2.47, com a descida do Espírito Santo, em Pentecostes, no cenáculo em Jerusalém, o louvor já acontece”, lembra o fundador do Koinonya, banda que marcou gerações e continua sendo referência no cenário musical, que também ressalta a postura de Paulo e Silas na prisão:
Perto da meia-noite, Paulo e Silas oravam e cantavam hinos a Deus, e os outros presos os escutavam. E, de repente, sobreveio um tão grande terremoto, que os alicerces do cárcere se moveram, e logo se abriram todas as portas, e foram soltas as prisões de todos [Atos 16.25,26].
Desde os primórdios, é inegável que o louvor tem impactado a igreja. Entretanto, ao longo do tempo, ocorreram algumas modificações, que variam conforme a comunidade de fé. Porém, de um modo geral, a participação da membresia se tornou mais efetiva.
“Ficou mais espontânea a participação no louvor que chamamos de ‘louvor congregacional’”, opina Bené. Segundo ele, anteriormente, a participação das pessoas era muito “engessada” porque elas acompanhavam os cânticos a partir dos hinários, Cantor Cristão ou Harpa Cristã nas mãos, o que atrapalhava a espontaneidade que existe atualmente.
Outra evolução destacada pelo compositor dos sucessos “Ao Único” e “Quem Pode Livrar como o Senhor”, é o ‘boom’ da excelência técnica a partir de vários recursos. “A experiência da música gospel vai além das quatro paredes. Nesse aspecto, estamos em pé de igualdade com a música secular”, avalia Bené, e conclui: “O gospel não perde em nada na qualidade técnica, mas o importante é a unção do Espírito Santo nas músicas, que sara os corações, liberta os cativos e traz arrependimento”.
Letra e melodia
Dentro desse contexto, a musicista Alzira Maria Bittencourt de Araújo diz que “o principal propósito dos cânticos deve ser o louvor e a adoração a Deus”. No entanto, ela reconhece que, como todo estilo musical, o louvor também evoluiu ao longo do tempo, principalmente nas letras e nas melodias.
“O texto ficou bastante coloquial, para que houvesse um maior entendimento da mensagem por parte do público, gerando ainda mais aproximação e identificação”, analisa Alzira, que ficou conhecida nacionalmente pela produção do espetáculo natalino “A Árvore que Canta”, acrescentando que, às vezes, algumas canções deixam um “vácuo” teológico ao não aprofundar certos conceitos nem deixar claro que estão anunciando Jesus.
Quanto às melodias, Alzira pontua que são bem simples, geralmente com frases melódicas muito repetitivas. “Isso não quer dizer que está melhor ou pior. Apenas que representa uma tendência atual”, observa ela, pontuando que “o valor da música gospel não mudou. Há grande responsabilidade em escrever e cantar o gênero”.
Como oferta espiritual, Hebreus 13.15 declara: Por ele [Jesus], pois, ofereçamos sempre a Deus sacrifício de louvor, isto é, o fruto dos lábios que confessam o Seu nome. E o apóstolo Paulo ensina à Igreja em Colossos [3.16]: A palavra de Cristo habite em vós abundantemente, em toda a sabedoria, ensinando-vos e admoestando-vos uns aos outros, com salmos, hinos e cânticos espirituais; cantando ao Senhor com graça em vosso coração.