23.3 C
Vitória
quinta-feira, 2 maio 2024

Igrejas ou orfanatos espirituais?

Fazer discípulos, além de exigir transformação de vida do discipulador, conduz o discípulo à vida transformada que se distancia de uma vida infantilizada na fé

Por Lourenço Stelio Rega

Tem sido comum vermos e ouvirmos sobre situações pelas quais muitas igrejas têm passado na atualidade que sinalizam para enorme fragilidade e Paulo já previa tudo isso ao lidar com a difícil igreja de Corinto (1 Co 3.1-3), repleta de “crianças em Cristo”. O autor do livro de Hebreus traz o mesmo diagnóstico (5.11-14).

Uma igreja será orfanato espiritual na medida em que seus membros deixam de ser objeto de amadurecimento doutrinário, espiritual, de vida transformada e transformadora. Não basta reunirmos muita gente nos cultos públicos, termos até mesmo bons resultados financeiros, se a vida dos membros da igreja não reflete maturidade e transformação. Precisamos de tudo isso para o Evangelho completo (At 20.27).

No início dos anos 1970, Billy Graham e outros líderes da época mencionou que estamos fazendo um trabalho de obstetrícia espiritual ao levarmos pessoas a se converterem, mas raramente um trabalho de pediatria. Isto é, estamos colocando no mundo eclesiástico mais e mais crianças em Cristo, sem darmos o devido cuidado em seu crescimento à vida adulta espiritual, ética e comportamental.

- Continua após a publicidade -

Assim temos a visão empobrecida que nutrimos do que seja a missão que Deus tem dado à sua igreja (Missio Dei). Chegamos até mesmo enfatizar que o nosso DNA é missões, que, apesar de ser uma frase bonita, reflete a visão salvacionista de que a salvação é um fim em si mesma, em vez de ser o meio de Deus para nos trazer de volta ao Éden para a reconstrução de nossa vida à luz do Seu Plano da Criação de modo a nos tornarmos novas criaturas (2 Co 5.17), não simplesmente novos membros eclesiásticos.

Na prática, é observável que, em geral, depois de salva a pessoa é colocada no banco do templo para, muitas vezes, ser como que “domesticada” na cultura da igreja, ser servil, contribuinte, frequentadora das reuniões, convidadora de amigos para ouvirem algum “profissional da fé” apresentar o plano da salvação e o ciclo continua.

Até mesmo para a chamada Grande Comissão (Mt 28.19,20) demos um inexistente imperativo que é o IR e se o crente não se sente chamado para ir, então pelo menos pague a conta dando oferta missionária. O FAZER DISCÍPULOS, o verdadeiro imperativo, acabou indo para o rodapé das preocupações. Mas convenhamos fazer discípulo não dá mesmo muita audiência, pois além de exigir transformação de vida do discipulador, conduz o discípulo à vida transformada que se distancia de uma vida infantilizada na fé.

É errado então investirmos em missões e evangelização? De modo algum, o que não podemos continuar a defender que essa é a única missão da igreja e que a salvação seja um fim em si mesma. A missão da igreja é muito mais ampla que apenas missões e evangelização. Na verdade, precisamos recuperar e praticar o todo do Evangelho (At 20.27).

Há urgente necessidade de redescobrirmos a integralidade do Evangelho, ampliar a nossa visão da missão da igreja, não confundindo-a com tarefas, pois missão tem a ver com algo a ser alcançado, finalidade para a qual existe algo. Tarefas são os processos que deverão ser executados para que esses alvos sejam alcançados.

Cabe-nos agora refletirmos se a igreja em que estamos como membros, se a igreja em que somos pastores é de fato madura, que expressa vida transformada e transformadora ou um orfanato espiritual com membros, ainda que adultos fisicamente, sejam infantes espiritualmente.

Lourenço Stelio Rega é escritor, licenciado em Filosofia pela UNIFAI-SP, bacharel e mestre em Teologia pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo, mestre em História da Educação e doutor em Ciências da Religião pela PUC-SP, especialista em Bioética.

Mais Artigos

- Publicidade -

Comunhão Digital

Continua após a publicidade

Fique por dentro

RÁDIO COMUNHÃO

Entrevistas