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sexta-feira, 26 abril 2024

“Espelho, espelho meu…”

A insatisfação com o corpo é uma marca do século XXI. Idosos, adultos, jovens, adolescentes e até crianças, ninguém fica de fora quando o assunto é criticar o próprio corpo. Mas, até aonde é lícita a busca pela aparência ideal, o corpo perfeito?

Existe um limite para a busca por um corpo saudável? Não estamos satisfeitos com o corpo que Deus nos deu? Será que estamos esquecendo que a orientação do Pai é “pensar nas coisas que são do alto, e não nas coisas terrenas” (Colossenses 3:2)?

Atualmente no Brasil existem 4 mil cirurgiões plásticos, noventa deles no Espírito Santo. Só no Estado, 18 mil cirurgias foram feitas no ano passado, sendo 11 mil delas estéticas e 7 mil reparadoras. Foram 1,5 mil procedimentos cirúrgicos da área por mês, 50 por dia, pelo menos dois a cada uma hora. No país, foram realizadas cerca de 616 mil cirurgias plásticas no mesmo período: 51.333 por mês, 1.711 por dia, mais de 71 por hora, 1,2 por minuto.

Quem prefere não se arriscar em salas de cirurgia lota as milhares de academias de ginástica espalhadas de norte a sul do país. Segundo dados da Associação Brasileira de Academias (Acad), mais de R$ 1,5 bilhão são movimentados no Brasil pelo setor, e o país já é o segundo no mundo em número de academias, perdendo apenas para o Estados Unidos. Metade desses estabelecimentos está na Região Sudeste.

Uma das modas agora, divulgadas com ênfase principalmente por artistas, é a retirada de costelas para afinar a cintura. Quem não quer optar pelo bisturi, adere a um movimento medieval, mas que voltou com o nome tigh lacing, que é o uso prolongado do espartilho, que muda o lugar das costelas flutuantes, afinando a cintura gradativamente, conforme as horas de uso.

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Assim como o rei Salomão alertou em Eclesiastes 1:2: “Vaidade de vaidades, tudo é vaidade”, qual tem sido o nosso critério quanto ao cuidado com a nossa vida, o nosso corpo? Temos nos embasado apenas nos padrões do mundo, sido obedientes à moda, sedentos pelo que há de novo nas clínicas de estética, nas salas de musculação?

Plástica e exercícios sem exageros

Sem exageros, a dona-de-casa Sueli Vargas, 48 anos, da Primeira Igreja Batista de Jacaraípe, na Serra, tem o perfil da mulher moderna. Mãe de quatro filhos, ela se autodefine como vaidosa e confessa que já fez plásticas. “Eu já tirei uma gordurinha localizada e coloquei silicone no seio, e me sinto melhor. Acredito que Deus aprova a gente querer se ver bem, mas é errado o exagero”, diz Sueli.

A estudante de Direito Julia Suzano Coqueiro, 19 anos, da Primeira Igreja Batista de Vitória, desde cedo esteve atenta a ter um corpo “sarado”. Todos os dias, por pelo menos uma hora, Julia foca toda a atenção no corpo, e fica feliz com o resultado.

“Acho importante manter-se saudável, mas tenho colegas que ficam a tarde inteira malhando. São pessoas que colocam o corpo como prioridade, e isso não acho certo. Eu gosto de malhar, mas tenho faculdade, inglês, as atividades da igreja. Não vou ficar adorando o meu corpo”, afirma.

Algumas pessoas trabalham nessa área, e aí é preciso ainda mais cautela para não cair no exagero. É o caso da personal trainner Ana Maria de Oliveira Ventorim, 28 anos, da Igreja Metodista em Itararé, Vitória. Ela é dona da AR Studio Pilates, na Praia do Canto, e conta que as academias cada vez mais cheias de meninas e meninos de 12, 13 anos. Os adolescentes chegam em busca de um modelo de corpo que os faça serem aceitos no grupo de amigos em que andam. Muitas vezes ela precisa alertá-los quanto ao limite físico adequado.

“Tem gente que malha três horas por dia e ainda não está satisfeito. Deus nos fez únicos e é um absurdo querermos nos transformar em outra pessoa. As pessoas não estão satisfeitas com o próprio corpo e praticamente querem devolvê-lo a Deus se matando em academias e se submetendo a inúmeras cirurgias”, declarou a personal trainner.

O médico Ubaldino Freitas, que manteve por alguns anos o Rejem SPA Hotel, também alerta para os exageros: “Homens e mulheres estão em busca de uma melhor aparência, que pode representar uma melhor aceitação social. Mas a vaidade excessiva pode esconder uma necessidade de auto-afirmação. Há limites, e a Bíblia nos ensina: ‘Fazei tudo com decência e ordem’ (I Coríntios 14:40). Por outro lado, vemos pessoas que não se importam com a condição física e nada fazem para melhorar a aparência. Esquecem que ter um corpo saudável é exigência para uma vida melhor”, destacou Ubaldino Freitas.

O pastor João Carlos Siqueira, da Igreja Assembleia de Deus Projeto Missionário Internacional, explica que a corrida exacerbada pelo corpo perfeito é pecado e cita que Paulo, em Romanos 12, orienta que devemos apresentar os nossos corpos como “um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus”. “É claro que algumas pessoas precisam passar por uma cirurgia para corrigir algum problema, mas a orientação bíblica é de que nos demos em sacrifício a Deus, e não à beleza, à perfeição física. Temos que nos entregar a Ele. O mais assustador é que isso tem chegado aos nossos templos, e em igrejas nos Estados Unidos, por exemplo, já é possível encontrar academias montadas”, declarou o pastor.

Cirurgia plástica em números
  • Existem atualmente no Brasil 4 mil cirurgiões plásticos.
  • No Espírito Santo são cerca de 90 médicos com essa especialidade membros da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
  • A cirurgia plástica mais realizada no Brasil é a lipoaspiração, seguida das plásticas para aumento de mamas (silicone) e redução de mamas. Logo depois vêm as plásticas de abdômen, de face, de nariz, etc.
  • No ano passado foram realizadas cerca de 616 mil cirurgias plásticas no Brasil, sendo que entre essas, 361 mil foram estéticas.
  • No Espírito Santo foram cerca de 18 mil cirurgias plásticas no mesmo período, sendo aproximadamente 11 mil estéticas e 7 mil reparadoras.
Estamos insatisfeitos?

A vaidade é um dos pecados que mais tem aflorado no mundo nas últimas décadas, e isso por conta também da mídia, que expõe modelos e apelos por um corpo sensual. A análise é da psicóloga e psicoterapeuta Gertraude Wanke, da Igreja Luterana de Bento Ferreira, em Vitória, também presidente do Sínodo da Igreja Luterana Conselho Espírito Santo. Segundo ela, criou-se uma necessidade de ter o corpo magro, de ter o exterior bonito, mas deixou-se de investir em valores reais.

“Às vezes isso é até imaturidade, falta de personalidade, mas o apelo do mundo é intenso. Não tem como escapar, a não ser que você seja um andarilho na escuridão e eu sou um desses andarilhos, porque não pinto o meu cabelo branco, não faço unha. É claro que é importante cuidar do corpo, mas muitos estão fazendo isso indiscriminadamente. É uma revolta, uma não-aceitação do que Deus deu. Se invisto apenas na casca, o interior fica vazio e isso é pecado. Eu me firmo muito no Sermão do Monte, em que Cristo diz: ‘Buscai primeiro o Reino de Deus’. A vaidade está presente e pegando todo mundo, até os evangélicos. Ficamos focados nas ‘imperfeições’ do nosso corpo e deixamos de ver que a natureza está morrendo, deixamos de visitar as pessoas. Quais são os nossos valores? Quais são os nossos propósitos no mundo?”, questiona.

A missionária Andréa Vargas, 34 anos, líder do ministério Avalanche, destaca que muitas vezes a busca pelo corpo perfeito esconde problemas de ordem emocional, e ressalta que vaidade é pecado.

“Como não seria, se desnorteia o ser humano dentro dele mesmo? A vaidade, por si só, já denota um problema de ordem pessoal. A partir do momento que a motivação pela busca do corpo saudável começa a ser focada no ‘eu’ de quem busca, o limite foi ultrapassado e haverá mais prejuízo do que ganho. Se eu uso meu corpo para ter poder sobre os outros, para me auto-afirmar diante do meio que me cerca, para exercer minha independência de Deus ou para ser a razão da minha existência, não estou mais no centro da vontade do Pai. Errei o alvo, pequei e vou sofrer a dor do pecado”, destaca.

O cirurgião plástico Márcio Vicente Teixeira Lima, membro da Primeira Igreja Presbiteriana de Vitória, explica que muitas das cirurgias plásticas não são puramente estéticas, mas também reparadoras. São os casos de pessoas que sofreram acidentes e perderam membros do corpo, que sofreram queimaduras ou nasceram com alguma dificuldade física.

Ele detalha que os pacientes vão desde crianças a idosos. A partir dos 6 anos, por exemplo, começam a aparecer crianças com “orelha de abano” e que por conta disso estão com baixa auto-estima. Adolescentes chegam reclamando do tamanho do nariz. Moças com 18, 20 anos, estão em busca de reduzir ou aumentar a mama.

Entre 22 e 25 anos, a procura já é para fazer lipoaspiração em gorduras localizadas. Acima dos 50 anos, para corrigir marcas no rosto.

E os homens têm cada vez mais procurado os recursos da cirurgia plástica, segundo Márcio Lima, principalmente para implante de cabelo, lipoaspiração, orelhas de abano, nariz e ginecomastia (crescimento das mamas).

“Há homens que não tiram a camisa de jeito nenhum, e mulheres que não dispensam a cinta e nunca se permitem usar um short. E quando fazem a cirurgia, essas pessoas aumentam sua auto-estima. A beleza foi criada por Deus. Deus fez o belo, gosta do que é belo. Se uma crente está com a barriga muito grande e toda roupa que coloca fica feia, ela pode fazer uma cirurgia. Mas muitos vão criticá-la porque é crente. Isso é um preconceito de pessoas que não têm conhecimento bíblico até, porque a Bíblia fala da valorização da pessoa. Em Cantares, Provérbios, há o estímulo pelo cuidado com o corpo, valorizando a beleza”, destaca o cirurgião plástico.

Mas ele admite que há pacientes que exageram nas cirurgias. Nesses casos, segundo ele, o médico precisa diagnosticar, porque pode ser até uma doença mental ou psicológica que se reflete em um problema estético.

“Normalmente são pessoas que não ficam satisfeitas com a própria cirurgia e vivem procurando outra. Isso já é idolatria. São desvios, patologias”, revela Márcio Lima.

Limite é saber o que é importante

O pastor Erasmo Vieira, da Igreja Batista em Morada de Camburi, em Vitória, destaca que o limite do cuidado com o corpo para não se tornar pecado está na avaliação do que é mais importante na vida do cristão. Ele ressalta que o Pai é bem claro quando explica como vai recompensar o seu povo. “Eu, o Senhor, esquadrinho a mente e aprovo o coração” – Jeremias 17:10. Não há na Bíblia afirmações de que Deus vai avaliar o corpo.

“A insatisfação com o corpo ocorre por motivos emocionais e pela visão espiritual distorcida. Via de regra, o exagero da atenção à forma física é indício de baixa auto-estima: a pessoa quer ser vista a partir exclusivamente do corpo. É preciso saber o limite. Qualquer coisa que tome o lugar de Deus é uma forma de quebrar os dois primeiros mandamentos (Não terás outros deuses diante de mim. Não farás para ti imagem esculpida – Êxodo 20:3 e 4). Precisamos cuidar do nosso corpo, em termos de saúde e de aparência. Em Lucas 8:35 lemos que depois que Jesus curou o endemoninhado ele estava com ótima aparência. Já Paulo estimula Timóteo a cuidar da saúde. Mas, quando colocamos esses cuidados acima do compromisso que precisamos ter para com Deus, cometemos pecado. Passamos a idolatrar o corpo”, alertou.

O escritor Bill Jones, em seu livro “Auto-Imagem: Aprendendo a se amar”, destaca que é preciso desconsiderar a opinião do mundo, já que “a sociedade mede o valor pessoal de forma totalmente oposta à maneira como Deus mede. Sempre que você estabelece o seu valor pessoal baseando-se nos padrões do mundo, está arranjando encrenca. Cedo ou tarde você não conseguirá corresponder a todas aquelas áreas, e o resultado será insegurança. Nenhum padrão da sociedade é seguro. Eles estão sempre mudando”.

“A Bíblia faz muitas referências à idéia de uma boa aparência. Esse é um sinal de que Deus quer que valorizemos, até certo ponto, o corpo, que é parte integrante de nossa personalidade. Qual o criador que não quer ver sua criação bonita e valorizada?”, conclui o pastor Erasmo.

A idéia de conseguir um corpo perfeito é tentadora, mas pode ser uma perigosa armadilha. O cristão deve, antes, se perguntar o motivo de Deus o ter feito desse ou daquele jeito. Cada um foi feito à Sua imagem e semelhança, para a Sua glória. É preciso cuidado para não ser vítima da vaidade exagerada, mas também lembrar-se que o Pai nos quer bem. O apóstolo Pedro destaca a verdadeira vontade de Deus quando o assunto é beleza. “O vosso adorno não seja o enfeite exterior, como as tranças dos cabelos, o uso de jóias de ouro, ou o luxo dos vestidos, mas seja o do íntimo do coração, no incorruptível traje de um espírito manso e tranqüilo, que és, para que permaneçam as coisas” (I Pedro 3:3 e 4). Essa deve ser a convicção a embasar o agir de todos os cristãos, que devem sempre dizer: “Eu te louvarei, porque de um modo tão admirável e maravilhoso fui formado”(Salmo 139:14).


Dicas de leitura

Auto-Imagem: Aprendendo a se amar
Bill Jones
Editora Jumoc

Construindo uma nova imagem pessoal
Josh MacDowell
Editora Candeia


Matéria publicada em julho de 2007, na edição nº 119 da Revista Comunhão

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