A afirmação é do cientista político Fernando Pignaton, que analisou o próximo pleito com base no estudo da Mar Asset sobre a influência do eleitorado evangélico
Por Cristiano Stefenoni
Se a direita não se unir, Lula vencerá novamente a eleição em 2026. A afirmação é do cientista político Fernando Pignaton, ouvido por Comunhão para uma análise sobre o próximo pleito, levando em consideração o estudo “O impacto dos evangélicos no cenário eleitoral brasileiro”, realizado pela Mar Asset Management. O levantamento revela, em números, a importância do eleitorado evangélico na definição da sucessão do chefe do Executivo.
A Mar Asset analisou diversas pesquisas conduzidas por institutos como Quaest, Datafolha, Paraná Pesquisas, IPEC, Atlas e Pew Research Survey, entre outros. De acordo com o estudo, os três principais fatores que poderiam impedir a reeleição de Lula seriam: o crescimento da população evangélica, a avaliação negativa do atual governo, mesmo com indicadores econômicos positivos, e o fraco desempenho dos candidatos de esquerda nas últimas eleições municipais.
O estudo conclui que, em 2022, Lula venceu o segundo turno com 50,9% dos votos. Até 2026, estima-se que a proporção de evangélicos crescerá 3,7 pontos percentuais. Se essa expansão já tivesse ocorrido em 2022, a votação de Lula teria caído 2,2 p.p., suficiente para mudar o resultado da eleição. “Na verdade, até um aumento de 1,6 p.p. na fatia de evangélicos já bastaria para o PT ser derrotado”, diz o estudo.
Outro ponto abordado pela Mar Asset é quanto a relação entre evangélicos e o voto. A análise mostrou que nos estados com maior quantidade de templos, a votação no PT tende a ser menor, e vice-versa. “Em quase todos os estados com mais de 60 templos por 100 mil habitantes, o PT obteve menos de 50% dos votos totais no segundo turno. Nos estados com menos, o PT obteve vitória em praticamente todos os estados e anos”, afirma.
O crescimento dos evangélicos também é apontado no estudo como fator determinante para mudar o rumo das eleições em 2026. “Estimamos que os evangélicos representarão 35,8% da população em 2026, contra 34% em 2022. Apenas esse aumento já seria suficiente para alterar o resultado da eleição, mantendo-se todos os demais fatores constantes. Ou seja, mantidas as intenções de votos no PT entre evangélicos e não evangélicos iguais às de 2022, Lula obteria 49,8% dos votos válidos”, analisa a Mar Asset.
Cientista político diz que divisão partidária fará a diferença
Na análise do cientista político Fernando Pignaton, nenhuma das variáveis apontadas no estudo da Mar Asset podem cravar a derrota do atual presidente. Na sua opinião, o que vai decidir o próximo pleito será a união ou não da direita que, na opinião dele, está dividida. Ele lembra que, nas eleições passadas, havia um acordo entre partidos de direita, centro e extrema-direita em prol de Jair Bolsonaro, algo que não existe agora.

Pignaton lembra as últimas eleições, em especial, a de São Paulo. Bolsonaro apoiou o candidato à reeleição Ricardo Nunes (MDB), porém, parte do seu eleitorado apostou suas fichas em Pablo Marçal (PRTB). Além disso, Gilberto Kassab, presidente do PSD, que é de centro, saiu do último pleito como um dos grandes vencedores por sua capacidade de articulação política, com o seu partido tendo a maior conquista de cadeiras municipais em SP (205). A questão é que Kassab está tanto no governo de Tarcísio como no de Lula.
“Dificilmente Jair Bolsonaro reverterá a sua inelegibilidade até o ano que vem, não há tempo hábil para isso e, caso haja alguma manobra para torná-lo elegível novamente, há uma grande chance de não passar pelo Supremo Tribunal Federal (STF). E todos os outros possíveis candidatos que sobraram para a disputa estão divididos e perdem para Lula em todas as pesquisas até agora”, justifica Pignaton.
A mais recente pesquisa da Atlas, divulgada na última terça-feira (11) mostrou que, numa provável corrida presidencial para 2026 sem a presença de Jair Bolsonaro, por exemplo, o atual presidente teria 41,1% das intenções de voto contra 26,2% de Tarcísio de Freitas (Republicanos). Na comparação com Eduardo Bolsonaro (PL) a vantagem é ainda maior, sendo que ele teria 24,2%, e Lula, 40%. Pablo Marçal (PRTB) aparece apenas com 3,4% das intenções de voto.
Esses números seguem a tendência de outra pesquisa divulgada na semana passada pela Genial/Quaest, e que mostra exatamente a força da direita caso ela esteja unida. Lula aparece com 30% das intenções de voto, enquanto que, todos os nomes da direita juntos somam 42%. Mas de forma isolada, o atual presidente ganha em todos os cenários: Tarcísio de Freitas (13%), Gusttavo Lima (12%), Pablo Marçal (11%), Romeu Zema (3%), Ronaldo Caiado (3%) e Ciro Gomes (9%).
Uma opção de nome seria o jovem expoente da direita, Nikolas Ferreira (PL-MG). Contudo ele só tem 28 anos e a idade mínima para ser presidente do Brasil é 35 anos. Mas já há movimentos para tentar mudar isso. O deputado federal Eros Biondini (PL-MG) tem coletado assinaturas para uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que estipula 30 anos como idade mínima para assumir os cargos de presidente, vice-presidente e senador.
O próprio Kassab já havia alertado para a força de Lula mesmo em meio ao cenário de críticas que o seu governo vem sofrendo. “Ainda é muito cedo para afirmar qualquer coisa sobre a eleição. Ele ainda pode reverter o cenário. Ele é forte”, afirmou o presidente do PSD em entrevista ao Estado de S. Paulo, no início deste mês.
Desgaste da imagem prejudica Bolsonaro
Além disso, o cientista político ressalta que a imagem de Bolsonaro tem sido desgastada nos últimos meses por conta das investigações da Polícia Federal sobre a venda ilegal de presentes oficiais, a Operação Tempus Veritatis para apurar a tentativa de golpe de Estado, as milícias digitais, a interferência na PF, a fraude na caderneta de vacinação, a divulgação de informações sigilosas, as fake News e ameaças ao STF.
“Tudo isso fez com que muitos apoiadores de Bolsonaro se afastassem. Ele ainda tem o apoio de um núcleo duro em torno de uns 15%, mas é só. Além disso, na época da gestão bolsonarista foram prometidos mundos e fundos, o que não aconteceu. Aliás, a economia cresceu menos que o atual governo Lula”, explica Pignaton.
Força dos evangélicos é capitaneada por pautas em comum com outras religiões
Para o doutor em ciências da religião, professor Marcos Simas, a força da bancada evangélica, bem como a importância do eleitorado evangélico não se dá apenas por questões geográficas ou de crescimento e expansão das igrejas. Trata-se das pautas defendidas que são de comum acordo com outras religiões, como a católica, por exemplo.

“É bom lembrar que temos pautas comuns com os católicos. Os católicos têm poder, tradição, liderança, recursos, cultura e agenda próprias, principalmente quando se fala de um conservadorismo comum aos cristãos no que diz respeito a determinadas pautas”, justifica Simas.
Na opinião do professor, a visão de ser de “direita” é muito mais amplo do que simplesmente uma ideologia partidária ou projetos de governo. “Não existe ‘direita’. Existem ‘direitas’, com suas inesgotáveis variantes. Assim como não existe um ‘evangélico’ uniforme, padrão formatado estereotipadamente, mas existem ‘evangélicos’ exercendo de uma forma fragmentada sua fé e cidadania”, explica.
Sobre o peso do voto da evangélico nas próximas eleições, o professor Simas diz que é difícil fazer um prognóstico, mas reconhece que a participação das igrejas evangélicas na sociedade tem sido a mais forte das últimas décadas.
“Acho que a sociedade em nosso país está se reconfigurando, a partir da religião protestante (evangélica). Ainda é difícil entender a profundidade disso. Mas o fato inegável é que algo está mudando. E está mudando rápido demais para os observadores, pesquisadores, políticos e até mesmo para os próprios líderes cristãos conseguirem acompanhar. É um boom muito rápido e efervescente que ainda está em pleno processo de mutação. Daí ser tão difícil avaliar e delimitar, enquanto a mudança está acontecendo. Mas sem dúvida há um novo tipo de agente envolvido no sistema político do Brasil, com elementos e valores diferenciados em relação ao que era há 20, 30 anos”, finaliza.

