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terça-feira, 15 DE outubro DE 2024

Entrevista: Psicóloga explica alta de divórcios no Brasil

Foto: Reprodução

Com alta de 16,8%, Brasil registrou cerca de 387 mil divórcios em 2021. Casais com filhos menores de idade são os que mais se separam.

Por Lilia Barros

Uma pesquisa de Estatísticas do Registro Civil foi realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que em 2021 aconteceram 386,8 mil dissoluções de casamento no país. A alta foi de 16,8% no número de divórcios realizados no Brasil em comparação ao ano anterior. 

O tempo médio entre a data do casamento e a data da sentença ou escritura do divórcio diminuiu. Em 2010, esse período era de 15,9 anos, enquanto que, em 2021, a média caiu para 13,6 anos. Os casais com filhos menores de idade são os que mais se separam, com 48,5% dos divórcios, um crescimento de 5,5 pontos percentuais em relação a 2010.

Entrevista: Psicóloga explica alta de divórcios no Brasil
Renata Lang Stapani, psicóloga clínica (SP). Foto: Divulgação

A psicóloga clínica, de São Paulo, Renata Lang Stapani, cristã, com experiência de trabalho com famílias, em entrevista à Revista Comunhão, explicou a alta no número de divórcios no Brasil e pontuou o papel da Igreja na luta para preservar o casamento saudável.

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Comunhão: A quais razões a senhora atribui essa alta no número de divórcios?

Renata Lang Stapani: Várias razões levam ao desentendimento entre casais, porém na pandemia e no pós-pandemia os motivos se exacerbaram. O confinamento em um breve momento parecia interessante. Relaxar, lidar com a novidade do trabalho on-line, lidar com a ilusão de ter todo o tempo do mundo para arrumar gavetas e papeladas, etc. Porém, com o passar dos meses, o convívio por 24 horas diárias revelou-se numa surpresa.

Muitos casais descobriram que, com a vida corrida de antes, eles mal se viam. Já não se conheciam mais e com isso a chance de implicar um com o outro em hábitos simples e corriqueiros ficou insuportável. Resumindo: a convivência durante 100% do tempo em espaço de confinamento trouxe conflitos muitas vezes decisivos para a separação. Em um nível simbólico, “estou confinada, mas pelo menos tenho minha liberdade pessoal”

Por que a separação geralmente ocorre na fase em que os filhos ainda são crianças?

Filhos pequenos demandam atenção, tarefas, cuidados educacionais e outros. Nem sempre ambos pais estão disponíveis para estas funções. Surgem cobranças mútuas, o que gera stress e desgaste conjugal. Estas questões contribuem para a desistência da relação.

Será que filhos adultos tentam impedir a separação dos pais? Ou filhos menores sofrem menos com a separação?

Em qualquer idade há sofrimento diante da realidade de assistir às pessoas que mais amamos se separando, independente da fase de desenvolvimento que nos encontramos. Adultos também sofrem se os pais anunciarem que vão se separar. Sempre dói, gera uma divisão no coração do filho. Mesmo que em alguns casos traga relativo alívio, porque os pais vão deixar de brigar, gritar, ou cometer abusos verbais e/ou físicos, a tristeza se faz presente. Representa também a quebra da estabilidade familiar: as festas, os passeios, as datas comemorativas serão alteradas.

No período de maiores conflitos o clima da casa fica tenso (desentendimentos, decepções) e já é um momento emocional conflituoso, com a presença de sentimentos como a apatia, a insegurança raiva, às vezes rebeldia. Portanto, a separação traz muitas mudanças que afetam crianças ou filhos mais velhos. Sempre é um turbilhão até que as coisas se ajeitem e todos se adaptem à nova realidade.

Na sua visão, a pandemia provocou aproximação ou distanciamento dos casais?

No meu consultório tive um caso onde o casal que vivia distante e “separado”, apenas dividiam o apartamento. Mas eles acabaram contraindo o vírus da Covid e um cuidou do outro. Essa experiência gerou gentileza, carinho e os reaproximou. Imagino que outros casais possam ter experimentado a aproximação. Porém, muitos outros se separaram. Não aguentaram a experiência do convívio 24 horas, sentiram-se invadidos ou sobrecarregados e não conseguiram lidar com a frustração do confinamento. Perderam a perspectiva da vida a dois e a possibilidade de transcender a este período, inclusive de ameaças à sobrevivência.

Pela sua experiência de psicóloga, qual dos cônjuges apresenta mais resistência em reatar o casamento e por quê?

É difícil generalizar. No século passado eu responderia com certeza que a maioria dos homens não reataria. Deixavam suas esposas e buscavam outros relacionamentos pela intolerância, cobrança, desejo de liberdade (sexual inclusive). Nestes primeiros 20 anos do século 21, a sociedade mudou muito. As mulheres são independentes, se autossustentam, tornaram-se mais fortes e ousadas para sair à luta, para decidir seu destino, não se submetem ao que não gostam e não parecem temer a solidão.

Portanto, elas já não resistem mais à separação. Querem liberdade e tentar outra oportunidade de amor. Os homens que resistem, segundo a minha experiência, desistem logo e partem para outras possibilidades: tiram ano sabático, encontram logo outro relacionamento, e dificilmente ficam sozinhos.

Por que os casamentos no passado duravam mais? Dá para fazer um paralelo com os casamentos atuais?

Os casamentos de antigamente tinham outros valores para além do amor: tolerância, compromisso, desejo de continuidade, de estabilidade e para isso as pessoas persistiam. A sociedade e a igreja condenavam as desistências. Hoje somente lamentam. Alguns casais persistem até hoje tentando tornar as partes difíceis, mais leves. Há também a esperança de fases melhores. Mas atualmente o lema é “amor até quanto dure”… até desandar… até um dos dois não aguentar…

Podemos considerar que o desequilíbrio nas finanças, perda de emprego, abusos de qualquer ordem (verbal, físico, substâncias químicas, adultério, compulsões, etc.) quebram o relacionamento e ninguém hoje em dia suporta como as pessoas de antigamente. Sentem-se livres para deixar o que não agrega, o que não constrói.

Casos de divórcio na igreja eram raros. Hoje está sendo naturalizado. O que está acontecendo?

A Igreja acompanha a sociedade dentro dos limites teológicos, eu penso. A Igreja admite o que o governo admite, a exemplo tanto das questões do divórcio quanto da união estável. Um casal que vá morar junto está protegido por lei. Creio que o papel da Igreja seja orientar o casal a regularizar sua situação perante Deus, mas para o governo, “regularizado está”. Voltando ao divórcio, creio que hoje o divórcio já não é mais raro pelos motivos citados acima: a mulher não se submete mais a abusos e hoje ela pode se autossustentar.
O melhor seria que houvesse respeito mútuo para que o compromisso feito no dia do casamento, em amor e perante a família, fosse realmente sagrado.

O que a Igreja pode fazer para minimizar o crescimento no número de divórcios?

A Igreja pode ministrar sobre os componentes que vivificam a relação a dois: a comunicação de qualidade, a gentileza mútua, o uso do dinheiro, o cuidado dos filhos e da casa, a distribuição das tarefas, etc. Incentivá-los a continuarem a usar as “palavrinhas mágicas”: obrigada, por favor, da licença, desculpe… ter asseio e ordem. E ainda contribuir para a educação sexual do casal com palestras de orientação. Nos convertemos, eu e meu marido, quando eramos recém casados e nos surpreendemos com palestras de orientação sexual e relacionamentos na igreja. Foi fundamental para nossa vida conjugal. 

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