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sexta-feira, 29 março 2024

Os sonhos de Deus

“Os sonhos de Deus”. Será que essa afirmação se sustenta diante de uma avaliação criteriosa?  Deus sonha? O sonho é nosso ou de Deus? Não seria uma inadequação dizer que Deus tem sonhos?

Não raras vezes, ouvimos a respeito dos “Sonhos de Deus”. Por isso, julguei oportuno pensar um pouco sobre o tema. Assim, verificaremos o que diz a ciência, o que diz a Bíblia, e finalizando, apresento uma pequena conclusão.

O que diz a ciência

Para Freud, o sonho é a satisfação dissimulada de um desejo, porque é uma mensagem do inconsciente para o consciente da pessoa, de forma condensada e deslocada, geralmente enquanto se está dormindo. A condensação e o deslocamento fazem parte da linguagem do inconsciente.

A neurociências, não obstante, dezenas de hipóteses e pesquisas apresentadas sobre  sono e sonhos, continua vendo-os como que rodeados de mistérios, porque, especificamente sobre sonhos, nenhuma teoria foi totalmente comprovada. Nos últimos anos, ocorreram alguns avanços no entendimento de seus mecanismos e funções, mas nada que desacreditasse a opinião do criador da psicanálise.

Resumindo, podemos dizer que a neurociências entende o sonho como um processo psíquico ativo real ou imaginário. Ele ocorre tanto no sono não-rem (profundo), quanto no rem (mais leve), instantes antes de acordamos. Praticamente todos nós sonhamos; mas, os do sono não-rem nem sempre lembramos e, eventualmente, quando lembramos, seu conteúdo é condensado. Recordamos o último sonho ocorrido no sono rem. Existe quem não se recorda de seus sonhos, mas isso não significa que não sonhe.

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Acresce-se quanto à sua interpretação que algumas linhas de abordagens psicoterápicas aventam ainda que eventos vegetativos pontuais podem acelerar a tramitação da mensagem inconsciente/consciente, sem a possibilidade de alterar o seu conteúdo original.

Essas inferências dão sustentação para afirmarmos que o sonho é inerente a um ser incompleto que não tem onipotência para realizar todos seus intentos.

O que diz a Bíblia

Na Bíblia, há muitas passagens quanto aos propósitos e pensamentos de Deus, mas não sobre sonhos de Deus. As passagens que falam de sonhos referem-se a homens. À luz das Escrituras Sagradas Deus têm planos e propósitos que podem ser revelados aos homens quando e como Ele quiser, conforme Seus desígnios, inclusive por meio de sonhos; mas, isso não nos autoriza afirmar que Deus sonha.

E o sonho acordado? Este jamais poderia ser aplicado a Deus, porque o nosso Senhor é um Espírito Eterno (Hebreus 9:14) que, independentemente de nosso tempo chrónos, é onipresente, está em todo lugar (Provérbios 15:3). É onisciente, sabe tudo (Salmos 139:4). É onipotente, tem todo poder (Mateus 19:26), e é presciente, conhece o futuro (I Pedro 1:2). O sonho acordado é uma figura poética aplicada a nós, sob condições específicas.

Há quem diga, embasado no antropomorfismo, que Deus sonha, outro equívoco que fere a natureza e os atributos de Deus. Porque as revelações são concessões divinas visando a atender a uma lacuna no ser humano, não o contrário. O antropomorfismo constatado em diversas passagens bíblicas é um recurso literário que nos transmite a concepção de Deus, através de Seu expressar em linguagem humana. O sonho é inerente a um limite de nossa psique.

Quando se sustentam posições à luz do antropomorfismo, atribuindo-se particularidades humanas a Deus, senão com o propósito de adorá-Lo e dignificá-Lo, inverte-se os valores e comete-se a heresia do reducionismo. Reduzir Deus é limitá-Lo. Limitá-Lo equivale a negá-Lo.

Ora, se o sonho é um desejo, e se desejo é emoção, e emoção é orgânica, portanto carnal, como pode Deus sonhar como alguns sustentam? E ainda mais: o que dizer do texto de Salmos 121:4, onde diz que o nosso Deus não dorme?

Se concebermos um Deus que sonha, além do reducionismo implícito, corremos o risco de condescendência com o pecado da Nova Era que sustenta que Deus é homem, e que todo homem é um deus.

Malaquias 2:17 diz que o Senhor estava enfadado com as palavras do povo. Os filhos de Arão, Nabade e Abiú, morreram por apresentarem um “fogo profano perante o Senhor” (Levítico 10: 1 e 2). Por não reverenciar a Presença de Deus, simbolizada pela Arca da Aliança, Uzá morreu (II Samuel 6: 6 e 7). Por mentirem a Deus, Ananias e Safira morreram (Atos 5: 1 a 10).

Finalizando, deixo uma questão para a reflexão do leitor: será que nestes tempos, mesmo vivendo debaixo da Graça, algumas de nossas construções, aparentemente, equivocadas ─ Os sonhos de Deus pode ser uma delas  ─ não estão enfadando o nosso Senhor?


Clovis Rosa Nery é psicólogo, membro da PIB Vitória e autor de 11 livros

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