A substância foi liberada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em dezembro do ano passado, para tratar 12 tipos de doenças
Por Cristiano Stefenoni
Em 1884, Sigmund Freud indicou, como meio de sedação, a cocaína em forma de colírio ao oftalmologista Karl Köller e, dali em diante, surgiu a anestesia local. A morfina, um poderoso analgésico, foi descoberta em 1805 por Freidrich Sertuner, utilizando o ópio, usado para fazer a heroína. Ao longo da história, componentes de drogas ilícitas também serviram como medicamento. O mesmo acontece com a maconha, da qual é extraída o canabidiol.
Em dezembro do ano passado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou o uso de medicamentos com canabidiol para tratar 12 tipos de doenças, entre elas epilepsia, esquizofrenia, Parkinson e Alzheimer.
Mas o canabidiol pode viciar? De acordo com o médico psiquiatra José Luis Leal, o uso do canabidiol na farmacologia não tem como finalidade levar ao entorpecimento.
“É uma finalidade exclusivamente terapêutica. Sua utilidade tem comprovação científica, de fato, para o tratamento de epilepsia e da esclerose lateral, por exemplo. A gente tem uma perspectiva, que à medida que surjam mais estudos, começará a ter mais segurança”, explica o médico.
O psiquiatra cita ainda outros benefícios proporcionados pelo canabidiol. “Causa alívio no sofrimento, na dor, ajuda no parto e traz efeitos na ansiedade, mas a gente não tem aprovação e nem comprovação de eficácia para tratamentos psiquiátricos, pois temos poucas pesquisas”, afirma.
É importante explicar que toda maconha possui o canabidiol e o THC (tetrahidrocanabinol). O canabidiol é um alcaloide com ação terapêutica. Ele é extraído da canabis, mas não tem ação psicoativa, ou seja, não provoca as reações que a maconha provoca em quem faz uso recreativo dela. O alcaloide responsável por essas reações é o THC.
Para uso terapêutico, usa-se apenas o canabidiol isolado. O medicamento não vicia, não causa dependência, porque não é maconha, é uma substância extraída dela.
De acordo com o pastor Édson de Oliveira Pinto, doutor em Psicologia e psicanalista especialista em Neurociência, ainda há necessidade de mais estudos não apenas para testar a eficácia do canabidiol em longo prazo, mas também seus efeitos colaterais.
“Desconheço estudos longitudinais para a cannabis. O que se sabe, seguramente, é que 30% dos adolescentes que usam maconha desenvolvem esquizofrenia. Então, não se sabe se o canabidiol, em longo prazo, trará sequelas para a vida das pessoas”, justifica.
Outro problema apontado pelo doutor é em relação a pressão feita por parte de alguns setores da sociedade para que haja uma liberação da cannabis sem mais estudos aprofundados.
“A codeína, a morfina e o tramadol são drogas que uma pessoa só usa com prescrição médica. Aí vem também o canabidiol, que tem sido uma droga que a mídia tem feito uma pressão muito grande. E ainda há uma outra pressão por parte de algumas instituições de ensino”, justifica.
Por outro lado, ele diz que mais estudos estão sendo feitos e que, em breve, a utilização correta da cannabis poderá ser de grande valia, assim como outras drogas já incorporadas pela medicina e que são amplamente usadas pela população.
“A Califórnia, nos Estados Unidos, é o estado onde se concentram os maiores investimentos na maconha. Lá, a cannabis é um investimento altíssimo, muito promissor, e eles querem chegar ao mundo. Então, investem em determinados países, e o Brasil, é um país muito visado nesse mercado consumidor”, afirma.