Dados da OCDE revelam que a indisciplina impacta saúde e rendimento docente; pais são decisivos na formação de hábitos de respeito
Por Cristiano Stefenoni
A sala de aula, que deveria ser um local de concentração, virou um local de disputa por atenção. Isso porque, em média, os professores brasileiros perdem 21% do tempo de aula para manter a ordem, segundo a Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem (Talis) 2024, divulgada na última segunda-feira (06), pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Na prática, a cada cinco horas de aula, uma hora é perdida para conseguir a atenção dos estudantes.
Para efeito de comparação, o percentual do Brasil é bem maior que a média dos países-membros da OCDE, que é de 15%. Além disso, 44% dos docentes afirmaram ser bastante interrompidos pelos alunos, mais que o dobro da média da OCDE, que é de 18%.
Os números negativos não param por aí: 21% dos professores afirmaram que estão estressados, 16% alegaram que a docência impacta negativamente na saúde mental e 12% a saúde física. Paralelamente a isso, apenas 14% acreditam que os professores são valorizados na sociedade. Curiosamente, 87% afirmaram que, no geral, estão satisfeitos com o trabalho.
Para o professor acadêmico, pastor Geraldo Moyses Gazolli Junior, que é mestre em Ciências da Religião e doutorando em Teologia, tanta indisciplina por parte dos alunos tem muito a ver com a atual realidade da sociedade, além da sobrecarga de trabalho dos professores e da própria grade curricular dos estudantes, que gera a necessidade de gastar parte significativa do tempo letivo para restabelecer ordem, atenção e respeito, diminuindo o espaço destinado à aprendizagem propriamente dita.
“Vivemos um tempo em que muitas crianças e adolescentes chegam ao ambiente escolar sem limites claros, com dificuldade em lidar com frustrações e em respeitar regras coletivas. Além disso, há um processo de sobrecarga das instituições escolares, que não apenas ensinam conteúdos acadêmicos, mas também precisam suprir lacunas de formação social, moral e até emocional deixadas em outros espaços”, justifica.
Responsabilidade principal é da família e não da escola
O professor explica que a disciplina tem origem primária no ambiente familiar, ou seja, é no lar que a criança aprende valores fundamentais, como respeito, obediência, solidariedade e autocontrole. Segundo Gazolli Junior, quando a família se omite nesse papel, a escola precisa assumir responsabilidades adicionais que não lhe competem de maneira exclusiva.
“A responsabilidade da família é intransferível: ela deve formar a base da disciplina, pois é no convívio diário que se estabelecem os primeiros hábitos e limites. Assim, alunos indisciplinados revelam, muitas vezes, uma fragilidade no processo educativo doméstico. A escola pode colaborar, mas não substitui a formação familiar”, afirma.
Dentro desse processo de educação na família, o professor Gazolli Junior diz que os pais precisam ensinar disciplina, antes de tudo, pelo exemplo. Segundo ele, a criança observa se os adultos cumprem horários, respeitam regras, falam com respeito, mantêm compromissos e lidam com frustrações.
Cristãos protestam contra nova lei eleitoral em Punjab - Maior grupo minoritário da província, os cristãos afirmam que o modelo político perpetua a exclusão e viola garantias constitucionais básicas
Nigéria: pastor relata ameaças de morte após denunciar assassinatos de cristãos - Ezekiel Dachomo afirma ter se tornado alvo de militares que o acusam de “incitar a população” ao questionar a passividade das forças de segurança diante… “Além disso, é essencial que os pais estabeleçam rotinas claras, delimitem regras objetivas e, quando necessário, apliquem consequências coerentes e proporcionais às atitudes dos filhos. Outro aspecto importante é o diálogo, que ajuda a criança a compreender o sentido das normas e internalizá-las, ao invés de apenas obedecer mecanicamente. A disciplina, portanto, é cultivada pela coerência entre discurso e prática dentro do lar”, enfatiza.
Por outro lado, os pais precisam entender que a escola é corresponsável pela formação integral do estudante, o que inclui valores éticos e convivência social. Gazolli Junior diz que o papel da instituição de ensino é reforçar os princípios transmitidos pela família, promovendo um ambiente de respeito, cooperação e responsabilidade coletiva.
“A escola deve aplicar regras claras, justas e conhecidas por todos, de forma a criar um clima organizacional que favoreça a aprendizagem. É importante também que os professores, gestores e funcionários sejam modelos de disciplina e respeito, pois o aluno aprende tanto pela instrução quanto pela vivência. No entanto, a escola não pode ser vista como a única responsável: sua atuação deve ser complementar ao trabalho iniciado no lar”, conclui.
Sobre o estudo
O estudo foi feito a partir de entrevistas com professores e diretores, principalmente, dos anos finais do ensino fundamental (6º ao 9º ano) e compara a educação em 53 países. Esta é a 4ª edição da Talis, que foi realizada no Brasil entre os meses de junho e julho de 2024. Os estudos sobre a realidade brasileira foram conduzidos pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), com a colaboração das secretarias de educação das 27 Unidades Federativas.
Dicas para os pais orientarem os filhos sobre o comportamento na sala de aula
1. Estabeleça regras claras em casa
Defina comportamentos esperados, como ouvir sem interromper e seguir instruções.
Explique por que essas regras são importantes e as consequências de não cumpri-las.
2. Seja exemplo de respeito
Demonstre respeito pelas figuras de autoridade, incluindo professores, pais e outros adultos.
Mostre como lidar com frustrações e opiniões diferentes de maneira educada.
3. Ensine autocontrole
Ajude a criança a reconhecer emoções antes de reagir impulsivamente.
Pratique técnicas simples, como respiração profunda ou contar até 10, quando estiver irritado.
4. Incentive a escuta ativa
Treine a criança a prestar atenção quando alguém fala, mantendo contato visual e não interrompendo.
Faça exercícios em casa, como ouvir uma história ou instrução e repetir o que entendeu.
5. Valorize a escola e o aprendizado
Explique que os professores estão lá para ensinar, orientar e ajudar a crescer.
Converse sobre a importância da educação e o papel de cada um no sucesso escolar.
6. Estabeleça rotinas consistentes
Horários regulares de estudo, alimentação e sono ajudam a criança a desenvolver disciplina.
Crianças com rotina tendem a se adaptar melhor às regras da sala de aula.
7. Use consequências coerentes
Se a criança desrespeitar regras, aplique consequências proporcionais, sem exageros.
Explique por que o comportamento não é aceitável, reforçando o aprendizado.
8. Promova o diálogo
Converse sobre situações da escola, perguntando como ela lidou com professores e colegas.
Ajude a criança a refletir sobre escolhas e atitudes, reforçando responsabilidade pessoal.
9. Reforce comportamentos positivos
Elogie quando a criança demonstra respeito, atenção e cooperação.
Pequenos reconhecimentos aumentam motivação e reforçam hábitos saudáveis.
10. Colabore com a escola
Mantenha comunicação regular com professores e coordenação pedagógica.
Mostre apoio às regras e orientações da escola, reforçando a importância da disciplina.

