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sexta-feira, 19 abril 2024

Manifestações e a igreja: um debate entre política e economia

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Foto: Marcos Correa/PR

Em um debate entre pastores, promovido por Comunhão é discutido os problemas que assolam o país e o papel da igreja diante da política e da economia

Por Ivy Coutinho

A instabilidade política que sofre o Governo Federal, a crise econômica vivida no Brasil, as prisões de pessoas que incitaram o Supremo Tribunal Federal levaram a população mais uma vez às ruas neste sete de setembro. A crise é generalizada, atingindo todos os setores que movimentam o país. É a política e a economia sob a ótica da igreja!

“Se o meu povo, que se chama pelo meu nome, se humilhar e orar, buscar a minha face e se afastar dos seus maus caminhos, dos céus os ouvirei, perdoarei o seu pecado e curarei a sua terra.” O verso bíblico de 2 Crônicas 7:14 é adequado ao momento político e econômico pelo qual passa o Brasil. Nesse panorama de incertezas, a população está indo às ruas demonstrar sua indignação e clamar pelo que é seu de direito.

Em 2013, uma onda de insatisfação no território nacional resultou em manifestações contra o Governo Federal. Em 2015, em meio aos muitos escândalos de desvios de recursos e pacotes econômicos rígidos, o povo retomou as mobilizações. Tanto uma quanto a outra, membros de milhares de congregações no país aderiram aos protestos, alegando que como cristãos, é preciso se posicionar na sociedade.

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Em março de 2016, Comunhão realizou um debate entre o presidente do Fórum do Político Evangélico do Espírito Santo, Evaldo Carlos Santos, José Ernesto Conti, pastor da Igreja Presbiteriana Água Viva e articulista de Comunhão e o pastor da Assembleia de Deus Vida Abundante, em Cariacica (ES), Paulo César Gomes. Os líderes falaram sobre o período que o país estava vivendo na época. Em 2021, cinco anos depois, o Brasil vive uma situação parecida e o povo novamente foi às ruas protestar.

Entre os assuntos abordados no bate papo estiveram a consciência política que tem sido formada nos membros da igreja; a participação dos cristãos nas manifestações que estão contra ou a favor do Governo atual; a crise econômica e como e quando é possível reverter o quadro de recessão que tem se formado por conta da conturbada situação do meio político. Confira!

Qual a diferença das manifestações ocorrida no Brasil? O movimento se consolidou

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“O povo evangélico está descobrindo que também é cidadão” – pastor José Ernesto Conti. Foto: Divulgação

Pr. José Ernesto Conti – De 2013 para cá, tem crescido no meio evangélico essa consciência política da responsabilidade nossa como cidadãos. É verdade que, por um lado, talvez, quando os pastores têm vontade política, a coisa anda mais rápido, independentemente da linha doutrinária. Vejo igrejas reformadas, batista e presbiteriana, e assembleias que são mais tradicionais lá na frente. O movimento atual talvez tenha acelerado um pouco essa conscientização. O povo evangélico está descobrindo que também é cidadão.

Pr. Evaldo Carlos de Souza – Aquela primeira manifestação é um marco decisório na consciência política da nação. Ali começa uma ideia de que o povo pode dizer alguma coisa através das ruas. Lá não tem partido, lá não tem defesa de A ou B. Vamos acabar com a corrupção, pedidos diversos e coisas misturadas. Agora as pessoas não querem mais esse tipo de Governo a que estamos sendo submetidos. Querem uma apuração daquilo que está sendo investigado na Operação Lava Jato. 

Pr. Paulo César Gomes – Acho que o acesso às informações está mais rápido; as redes sociais e a imprensa têm trabalhado nessa conscientização. Outro fator é a realidade na casa dos brasileiros, a necessidade. O problema era de Brasília, mas passou a ser a cozinha da gente, a casa da gente. Quando chegou a esse ponto, então o brasileiro acordou, veio a conscientização. Mesmo que a igreja não fale isso em púlpito, as pessoas têm essas informações pelas redes sociais e pela imprensa; o povo está se agarrando numa esperança de que é possível melhorar as coisas.

Estamos vendo um cenário de Executivo, Judiciário e Legislativo em batalha. E isso não pode incitar a violência?

Pr. Conti – Não sei a opinião dos colegas, mas confesso que estou um pouco preocupado com a possibilidade de o Brasil passar por uma convulsão social. Porque o PT está entrincheirando, se aquartelando, está chamando para as suas fileiras, o seu quartel, o pessoal do MST e dos movimentos sociais. Estão se estruturando financeiramente.

Eu tenho a preocupação de quando o outro lado começar com os movimentos e as marchas; esse grupo (opostos) vai começar a partir para o quebra-pau. Estão se sentindo as vítimas do sistema. Na visão deles, do Lula (Luiz Inácio da Silva, ex-presidente, também do PT, eles estão sendo atacados pelo juiz Moro, por todo mundo, e estão fazendo golpe. Estão vendendo isso internamente no PT.

Pr. Evaldo – Eu concordo com o pastor, porque esta é ultima instância do desespero, é a violência que é instigada pela liderança do partido. Nas próprias gravações, ele (Lula) diz que era para colocar o pessoal para dar pancada. E o ex-presidente Lula fez a convocação para que as pessoas partissem para o enfrentamento se fosse preciso. Entretanto, acho que vamos chegar a um momento em que todos os Poderes terão que agir.

O Legislativo tem a demanda do impeachment, tem que dar solução a isso, porque a pressão popular está muito grande: o Judiciário tem que agir no julgamento da Lava Jato e do Lula; e o Executivo tem que definir o caminho a tomar. Ela (Dilma) não vai insuflar a militância, não é possível. E nós, como Igreja, não podemos concordar com isso, porque violência gera violência. Jesus foi contra a violência, foi contra em todos os lugares, até no Getsêmani. Ou somos um país verdadeiramente democrático ou voltamos à barbárie.

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“A Igreja deve repudiar todo tipo de atitude irregular” – Paulo Cesar Gomes de Oliveira, pastor

Pr. Paulo – A gente precisa educar as pessoas a partir do nosso próprio exemplo. Como se forma um filho? Dando meu exemplo e segurança para ele. Então, como líderes, somos formadores de opinião, podemos incentivar o nosso povo a ir para a rua, mas não só para estar no meio do povo, mas também tendo uma proposta para isso.

O risco existe de um confronto, mas não acredito em guerra civil. Nosso país é muito grande para isso, eu acredito no nosso povo ordeiro, no equilíbrio e na cultura do povo brasileiro de não ir para isso. Jamais vou incentivar isso. Conforme foi falado aqui, Jesus nunca incitou isso, apesar de ter pegado o chicote e arrancado todo mundo do templo. Temos que tirar esses bandidos lá no chicote. (risadas)

Eu tenho medo do PT, porque os militantes são inconsequentes, parece que são cegos, são soldados que fazem o que seus líderes incentivam. Mas acho que o Brasil é muito maior do que isso. Nós vimos que apenas 10% são a favor do PT, então…

Pr. Conti – Na verdade, os Três Poderes estão brigando entre si. A minha preocupação é internamente a coisa degringolar, porque aí é o fim da normalidade deste país. E compete a nós orar pela serenidade. Neste ponto eu acho melhor que esteja o Ricardo Levandowski, e não o Joaquim Barbosa, comandando o STF (Supremo Tribunal Federal). O Legislativo está sem credibilidade porque precisa tirar o Eduardo Cunha (presidente da Câmara, PMDB) e o Renan Calheiros (presidente do Senado, também PMDB); então temos que orar.

Pr. Evaldo – Este é um problema grave que temos. A Constituição diz que os Poderes são independentes, mas há interferência entre eles no Brasil. Por exemplo, o Executivo legisla e não poderia. O Judiciário é todo escolhido pelo Executivo. É o maior absurdo, é a maior excrecência que se pode ter. Hoje, oito dos 11 membros do STF são escolhidos pelo PT. Se não fosse a decisão da Câmara e do Senado de definir a idade, seriam todos escolhidos pelo Executivo. É uma confusão, um interferindo no outro, e cria isso que estamos vivendo, essa disputa de poder e de quem manda mais.

A responsabilidade dos líderes das igrejas cresce muito em acompanhar quem da bancada evangélica usou a Igreja para se eleger, mas está jogando a Bíblia no lixo, não é?

Pr. Evaldo – Acho que a Igreja precisa se unir para colocar a pessoa lá e para pedir prestação de contas do mandato. Saber se o candidato tem condição ou não de continuar. Outra coisa, a pessoa que a Igreja elege vai ser fiel a ela (Igreja) ou ao partido? O cara não tem como ser apartidário, e vai ser cobrado isso dele. Nós, como Igreja, vamos nos posicionar através da nossa liderança para ser contra projetos que são contra a família.

E os favores que a liderança recebe do político e incentivam que vote nele, mesmo o candidato não tendo a melhor das reputações?

Pr. Conti – As igrejas não tomam e não vão tomar juízo. Então, agora estou atacando no lado contrário, no lado dos políticos, porque o número é menor e mais fácil de controlar. Quando eles alegam que os pastores pedem e não podem negar um pedido deles, então eu aviso que vou contar para todos que ele deu através de um manifesto do Conselho. Infelizmente, nós somos tão corruptos quanto os lá de fora, e isso machuca.

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Pastor Evaldo Carlos dos Santos. Foto: Renato Cabrini

Pr. Evaldo – Isso existe no nosso meio, como existiu no tempo de Jesus. Mas gosto da postura de Neemias, que quando os primeiros governadores espoliaram o povo, desviaram dinheiro, ele disse: “Eu assim não fiz por causa do temor de Deus”. Para mim, o temor de Deus tem que estar na vida do político. Vai chegar o momento que ele será colocado no fio da navalha. E não adianta dizer: Ah, mas todos os deputados usam a verba errado. Mas ele não vai usar.

Claro que podemos ter pessoas que vão fracassar no propósito, é possível, mas precisamos mandar soldados, não podemos desistir. Temos que dar oportunidade para outras pessoas que têm ideais. Acho que o Legislativo tinha que ser feito por um ideal e não por remuneração. Já pensou se tivéssemos pessoas idealistas? Que até tivessem suas despesas custeadas, mas fosse trabalho voluntário. Sei que vão dizer que não existe em nenhum lugar do mundo, mas será que não está na hora de repensar isso?

Qual o desfecho que esperam disso tudo? O que desejam e o que acreditam que vai acontecer?

Pr. Paulo – Eu sou um camarada que tem muita fé na mudança, porque senão perco o sentido de viver. Acredito que vá melhorar, mas não agora. Não vai ser o momento ainda, mas vamos ganhar muito, já estamos ganhando com a manifestação do povo, um pouco de transparência das coisas. Acho que vamos melhorar muito para a próxima eleição e temos que continuar trabalhando para isso.

Pr. Conti – Você é do time de Tomé, mas eu sou do time de Pedro. Eu creio que a Dilma vai cair, o Renan vai cair, e Cunha vai cair em 90 dias. Lula será preso, porque as provas estão aí, e a Odebrecht (empreiteira acusada de pagamento de propina) ainda vai falar tudo.

Pr. Paulo – Aí se estabelece o milênio. (risadas)

Pr. Conti – Mas meu medo é o que vai sobrar, eu tenho medo que sobrem Aécio Neves (senador, líder nacional do PSDB e oponente da Dilma nas últimas eleições, em 2014) e Geraldo Alckmin, (governador de São Paulo, também do PSDB). Quero muito que a enxurrada também leve eles, porque não queremos mais sujeira. Está comprovado que, quanto pior fica, mais rápido vai melhorar. Aí mas vamos ter outro estado de espírito da nação. Creio que em 90 dias vamos passar o Brasil a limpo.

Pr. Evaldo – Para mim, sem a ousadia dos procuradores da República e do juiz Sérgio Moro em ir fundo na Lava Jato e dar a publicidade que deram às gravações, não haveria a guinada que o Brasil vai ter. Eu acredito no impeachment, o Supremo vai se posicionar de forma diferente, porque ele foi de alguma forma afetado. Acho que não há perspectiva para o presidente da Câmara continuar, ele vai cair. Mas o presidente de Senado, é possível que ele consiga vencer este mandato. As lideranças que temos no Brasil estão desgastadas, o melhor seria uma nova eleição, mas não sei se o Supremo vai decidir isso. Me preocupa a posição do Senado, porque o Renan é comprável. O Cunha está envolvido com o impeachment e acredito que na Câmara será mais fácil, mas no Senado fica um pouco mais difícil.

Esta matéria é uma republicação exibida na Revista Comunhão – Março/2016, produzida pela jornalista Ivy Coutinho e atualizada em 2021 (Priscilla Cerqueira). Fatos, comentários e opiniões contidos no texto se referem à época em que a matéria foi originalmente escrita.

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