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terça-feira, 16 abril 2024

Filhos do divórcio: como mantê-los saudáveis emocionalmente?

O número de divórcios cresceu 8,6% em 2022. Cerca de 47,7% dos casais se divorciam com menos de dez anos de união, e a maioria deles tem filhos menores de idade

Por Patrícia Scott

O número de divórcios no Brasil cresceu 8,6% em 2022, na comparação com o ano anterior, saltando de 386.813 para 420.039. Desse total, 340.459 foram feitos por meio judicial e 79.580 de forma extrajudicial, no cartório. Os dados são das Estatísticas do Registro Civil de 2022, divulgados nesta quarta-feira (27), pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O número total de separações é o maior da série histórica iniciada em 2007 pelo IBGE. O levantamento indica que os divórcios judiciais concedidos em 1ª instância corresponderam a 81,1% dos divórcios do país.

Os casamentos que terminam em divórcio duram menos de 10 anos, de acordo com os dados do IBGE. Cerca de 47,7% dos casais se divorciam com menos de uma década de união, 25,9% permanecem juntos entre 10 e 19 anos até o divórcio, e 26,4% se separam com mais de 20 anos de casamento.

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O divórcio entre casais sem filhos permaneceu praticamente inalterado nos últimos anos. Em 2020, ficou em 29,7%, contra 29,4% em 2022. No entanto, em 2022, o perfil dos casais que se divorciaram foi majoritariamente de pessoas com filhos menores de idade: 54,2%, o que representa um avanço de 4% na comparação com 2020, quando o grupo representou 50,9%. Já o percentual de divórcio entre casais com filhos maiores de idade diminuiu nos últimos 12 anos: de 19,4% para 15,8%.

Nos últimos 12 anos, a idade média dos divorciados aumentou, segundo a pesquisa. Em 2010, as mulheres se divorciavam, em média, com 39,4 anos, e os homens com 42,6 anos. Em 2022, a idade média do divórcio dos homens saltou para 44 anos e a das mulheres subiu para 41 anos.

Nova realidade 

Diante dessa gritante e triste realidade, são justamente os filhos os mais afetados. Afinal, eles sempre desejam ver os pais juntos e felizes, mas isso nem sempre é possível.

Então, quando o divórcio é inevitável, como blindá-los desse processo doloroso? Como deve ser o comportamento do, agora, ex-casal, para que os filhos sejam emocional e psicologicamente saudáveis? A reportagem de Comunhão conversou com especialistas, pastores e mães que passaram pelo processo de divórcio para responder a essas e outras perguntas que permeiam o assunto.

Filhos do divórcio: como mantê-los saudáveis emocionalmente?
“A quebra da aliança não faz parte do plano de Deus, mas que o amor familiar deve ser preservado mesmo em meio à separação” – Pastora Eristelia Bernardo, da Igreja Casa do Pai, no bairro Vera Cruz, em Governador Valadares (MG)

Na visão do advogado Daniel Teixeira, professor de Direito da Universidade Estácio de Sá (RJ), a desburocratização do divórcio impulsionou o aumento de casos no Brasil, sem que fosse possível que o casal tivesse tempo de tentar a restauração, seja por terapia, seja por aconselhamento pastoral. “A grande questão é a baixa qualidade dos relacionamentos conjugais, que ficou ainda mais evidenciada com a pandemia”, analisa, acrescentando que as relações líquidas são o reflexo da desconstrução do casamento. “Os valores familiares estão banalizados, e as pessoas não investem tempo na relação a dois, que é descartável. Como consequência, temos uma sociedade desajustada”.

Quando é inevitável desfazer o casamento, segundo o advogado, uma questão importante deve ser observada: a alienação parental prevista na Lei 12.318/2010, que gera graves consequências emocionais e psicológicas. “É caracterizada quando há uma lavagem cerebral na criança ou no adolescente, ou seja, quando a mãe ou o pai imputa características falsas do outro genitor aos filhos”, explica Daniel.

Conforme o especialista, “como consequência, os filhos desenvolvem sentimentos negativos do pai ou da mãe, que normalmente é aquele que não detém a guarda do menor”. Também caracteriza alienação parental, segundo Daniel, dificultar o exercício da autoridade parental, impedir o contato da criança ou do adolescente com o genitor e não permitir o direito regulamentado de convivência familiar.

Relação afetiva

Todo processo de separação é difícil, doloroso e frustrante. Mesmo em tempos modernos, a intenção, no início da relação, nunca é pôr fim a uma história, que, geralmente, foi iniciada com amor, respeito e cuidado. A partir do momento em que os filhos se tornam objetos para atingir o outro, é iniciada uma disputa entre o ex-casal.

“No contexto de alienação parental, o objetivo é que o genitor seja visto de forma desmoralizada pelos filhos”, diz a psicóloga Marta Macedo, que adverte: “É um ato de violência. Crime previsto em lei”. Ela enfatiza que, muitas vezes, o adulto não percebe, mas danos são causados aos filhos com esse comportamento. “Porque estão impedindo que o menor construa uma relação afetiva com o pai ou a mãe”.

Esses prejuízos emocionais e psicológicos, diz a psicóloga, quando não são percebidos e trabalhados, são manifestados até na fase adulta. “Surgem adultos fragilizados, depressivos, com baixa autoestima e, em algumas situações, agressivos, o que interfere nas relações interpessoais”, comenta Marta.

Mesmo com a dissolução do casamento, a responsabilidade pela construção e pelo fortalecimento dos filhos continua sendo de ambos. “É preciso maturidade e respeito um com outro e, principalmente, com os seres gerados desse relacionamento”, ressalta a especialista.

Outro ponto-chave que precisa ser evidenciado é quando uma terceira pessoa é agregada a uma estrutura familiar que, muitas vezes, está fragilizada. Lidar com o novo é algo que gera medo e insegurança. Marta Macedo sugere que, antes da tomada de decisão, seja estabelecido um diálogo consistente e sincero com os filhos, para que se estabeleça uma relação honesta, sólida e confiável.

Diante de tantas denúncias de abusos cometidos contra menores por padrastos, as mães precisam ser vigilantes. “Não podemos generalizar, mas, como prevenção, é fundamental atentar para as mudanças bruscas de comportamento dos filhos”, enfatiza Marta, que conclui: “Demonstração de ciúme e posse pelas enteadas pode ser um sinal. Os sinais sempre surgem”.

“Porém, desde o princípio da criação, Deus os fez macho e fêmea. Por isso, deixará o homem a seu pai e sua mãe e unir-se-á a sua mulher. E serão os dois uma só carne e, assim, já não serão dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou, não o separe o homem (Marcos 10.6-9)

Laços amorosos

Na análise do Pr. Jander Monks, da Universidade da Família, organização cristã sem fins lucrativos com foco na educação familiar, o diálogo franco e transparente é fundamental para que os filhos não carreguem nenhuma culpa pelo fim do casamento dos pais.

“Muitas perguntas surgem e, com elas, a insegurança, o medo, o peso. Então, é importante o adulto conversar de maneira honesta”, assegura. O papel dos pais, diz o pastor, mesmo separados, continua sendo fundamental na construção do emocional dos filhos. “Nenhuma pessoa consegue substituir pai e mãe”, pontua.

O pastor Jander aconselha muita paciência e calma aos pais, tendo em vista que muitos menores mudam o comportamento a partir da quebra da família. “É preciso entender os motivos e, para isso, é preciso estar disposto a ouvir esses filhos com muito amor e acolhimento”.

O líder religioso analisa, ainda, que existe uma corrente na sociedade que apregoa que a família tradicional atrapalha o desenvolvimento do indivíduo. “E a partir desse pensamento as leis foram tornando mais fácil a dissolução do casamento”, avalia o pastor Jander, que enxerga os filhos do divórcio na desvantagem para a própria construção familiar.

“Na maioria das vezes, eles crescem entendendo que o casamento é ruim. Não traz felicidade e realização”, frisa e complementa: “Não tiveram a chance de desfrutar dos prós e dos contras de uma relação a dois, percebendo que, mesmo diante das dificuldades, vale a pena lutar pelo casamento. Que o amor tem o poder de restauração, e o perdão é libertador”.

Filhos do divórcio: como mantê-los saudáveis emocionalmente?
“Os pais devem ter atenção para o possível desenvolvimento de inquietações e transtornos em crianças e adolescentes, como a agressividade” – Rosi Siqueira, psicanalista

“A família é a base. O ideal é que não haja separação, porque gera muitos males a todos os envolvidos. A quebra da aliança não faz parte do plano de Deus”, prega a pastora Eristelia Bernardo, da Igreja Casa do Pai, no bairro Vera Cruz, em Governador Valadares (MG). No entanto, ela entende que o amor familiar deve ser preservado mesmo em meio à separação. “É inadmissível utilizar os filhos para atingir o outro. Os filhos devem ser blindados”, enfatiza e continua: “E os pais devem ser maduros para resolverem seus conflitos”.

É importante destacar, diz a pastora, que filhos não nascem prontos, mas são formados. “Eles são o resultado daquilo que os pais transmitem (Provérbios 22.6)”, ensina. A pastora Eristelia destaca que pais divorciados precisam educar os filhos na mesma sintonia, para que tenham um desenvolvimento saudável. “Os valores ensinados devem ser os mesmos. Pai e mãe precisam falar a mesma linguagem com os filhos”, cita. Caso contrário, de acordo com ela, dificultará a construção do caráter deles. “Os prejuízos ficarão evidenciados. Os menores devem ser sempre prioridade”.

Luto e futuro

A psicanalista Rosi Siqueira salienta que, mesmo que haja transtornos brandos e com mínimas consequências na vida de crianças e adolescentes, os pais precisam compreender que o divórcio não é extensivo aos filhos. “Ou seja, não existe divórcio de filhos”, observa.

Ela explica que os adultos não podem fingir que nada está acontecendo. “Logo, todos precisam vivenciar o luto da separação, para que o emocional e o psicológico comecem a ser ajustados”, frisa.

Rosi ressalta que toda perda traz dor e amargura, e os filhos podem sofrer inquietações e desenvolver transtornos. “Crianças e adolescentes, por exemplo, perdem o estímulo para os estudos. Outros se tornam agressivos, mentirosos ou buscam prazer em fugas que os façam esquecer o momento doloroso”, exemplifica e pondera: “Por isso são essenciais o acolhimento e a constante reafirmação do amor dos pais para com os filhos, por meio de palavras e gestos”.

Por outro lado, a psicanalista chama a atenção para o tipo de discurso que pais e mães têm com os filhos pós-divórcio. Rosi comenta que algumas meninas, pela sensibilidade e pela identificação com o sofrimento da mãe, podem desenvolver aversão ao sexo oposto, principalmente se ouvirem frases como “Nenhum homem presta”. Por outro lado, “alguns meninos podem se tornar frios, se entenderem que a mãe foi a culpada pela separação”.

Rosi afirma ainda que comentários do tipo “você é igual ao seu pai” ou “você é idêntica à sua mãe” não devem ser feitos. “Ninguém gosta de ser comparado”, avalia e comenta: “É primordial enfatizar aos filhos que o futuro pode ser promissor, se houver união familiar, independentemente do divórcio”.


Dicas de leitura

Filhos do divórcio: como mantê-los saudáveis emocionalmente?Ajudando os filhos a sobreviverem ao divórcio
Archibald D. Hart – Mundo Cristão

O psicólogo Archibald D. Hart ensina o que deve ser feito para ajudar os filhos a enfrentarem as dificuldades decorrentes do divórcio dos pais. Ele fala com sabedoria, lucidez e discernimento bíblico sobre questões a serem resolvidas quando os pais se separam. É possível que pais divorciados, com a orientação adequada, auxiliem os filhos a se tornarem mais ajustados e bem-sucedidos, mas isso exigirá bastante esforço.

 

 

 

Filhos do divórcio: como mantê-los saudáveis emocionalmente?Filhos do divórcio
Judith Wallerstein, Julia Lewis, Sandra Blakeslee – Edições Loyola

Leitura imprescindível para todos os filhos adultos oriundos de famílias divorciadas, como também para professores, juízes, advogados e profissionais de saúde mental. Questionando algumas das crenças mais acalentadas sobre o assunto, este livro há de alterar para sempre o modo como as pessoas pensam sobre o divórcio e seu impacto de longo prazo sobre a sociedade.

 

 

 

Filhos do divórcio: como mantê-los saudáveis emocionalmente?Lá e aqui
Odilon Moraes – Pequena Zahar

Uma pequena obra-prima que transborda de emoção, destinada a leitores de todas as idades. A escritora aborda com rara delicadeza um assunto difícil: a separação dos pais. Imagem e texto se unem para contar a separação, aos olhos de uma criança, que pode ser vivida de maneira positiva, sem menosprezar o sofrimento.

 

Esta matéria foi atualizada com dados recentes, mas contém opiniões republicadas de matéria feita por Comunhão em março de 2021.

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