Crescimento acelerado do cristianismo na África revela um descompasso entre a expansão da igreja e a capacitação teológica de seus líderes, desafiando missionários e instituições de ensino.
Por Patricia Scott
No contexto cristão, a igreja tem experimentado um crescimento significativo no Sul Global, especialmente na África, conforme revelam várias pesquisas. No entanto, esse avanço traz tanto oportunidades quanto desafios, principalmente no que diz respeito à formação teológica dos líderes. Em entrevista ao Christian Daily International, o Dr. David Tarus, diretor-executivo da Associação de Educação Teológica Cristã na África (ACTEA), destaca um descompasso entre o crescimento da igreja e a capacitação dos líderes para o ministério. Ele aponta que as instituições teológicas no continente estão formando menos de 10% dos líderes necessários.
A maioria das organizações teológicas recebe menos de 200 alunos anualmente, com algumas exceções, como o Seminário Teológico Batista da Nigéria, que tem mais de dois mil estudantes. Além da formação espiritual, Tarus enfatiza que os pastores africanos frequentemente exercem várias funções, o que exige treinamento adicional em áreas como empreendedorismo e transformação social. Para garantir a sustentabilidade da educação teológica na África, ele sugere investimentos estratégicos em bibliotecas teológicas, no desenvolvimento de lideranças e na criação de modelos financeiros sustentáveis.

O pastor e missionário Eberson Tobias, enviado pela Assembleia de Deus Ministério Vale das Virtudes de São Paulo à África, confirma que há, de fato, uma grande necessidade de capacitação teológica entre os líderes. Ele alerta que muitas igrejas são abertas sem que o pastor esteja devidamente capacitado para o desenvolvimento ministerial. “Há lugares remotos onde o pastor não tem sequer uma Bíblia.” Dessa forma, investir na formação de líderes e na distribuição de material teológico é um grande desafio.
“Muitos têm o desejo e a força de vontade, mas não possuem condições financeiras”, relata Tobias, que fundou a Escola Teológica Pastor Sebastião Antônio Alves, em Moçambique, no ano de 2011. “Ao longo da trajetória, já formamos centenas de obreiros e pastores, que têm impactado suas comunidades com as Boas-Novas do Evangelho”, afirma o missionário, que é responsável por 35 igrejas africanas, todas com um líder à frente. “A mais recente está no Malawi, onde já iniciamos os trabalhos.”


Entre os países onde o Evangelho tem crescido significativamente, Tobias destaca Nigéria, Gana, Quênia, África do Sul e Moçambique. Segundo ele, a busca espiritual dos africanos está profundamente ligada aos desafios que enfrentam, como pobreza, guerras internas e doenças.
“Eles se agarram à esperança e ao consolo que o Evangelho oferece, fundamentados na fé em Jesus. Além disso, os missionários de hoje compreendem melhor a cultura local e apresentam a Palavra de maneira que respeita as tradições, como a alegria e a dança na adoração, o que também contribui para atrair as pessoas”, explica ele, que está na África há 17 anos, na cidade de Beira, Moçambique. O pastor também destaca o trabalho dos missionários brasileiros, que realizam projetos sociais, especialmente nas áreas de saúde e educação, como uma estratégia eficaz de evangelização.

Dentro desse cenário, o pastor Amauri Oliveira, presidente da Agência Presbiteriana de Missões Transculturais (APMT), pondera que o desafio atual na formação de líderes passa, necessariamente, pela influência de conceitos animistas na teologia cristã na África, o que torna a necessidade de uma formação sólida na Palavra ainda mais urgente. Apesar disso, o Evangelho tem ganhado força, segundo ele, principalmente na Nigéria, África do Sul, Congo e Etiópia, ou seja, em países da África Subsaariana.
Para suprir essa carência, a APMT tem investido na formação de líderes no continente africano. Por meio de convênios educacionais com seminários brasileiros, os pastores locais têm acesso a capacitação teológica. “Enviamos professores para oferecer treinamento e também trazemos professores africanos para que recebam formação no Brasil e, depois, retornem para ensinar o que aprenderam. Além disso, realizamos a distribuição de literatura cristã, o que ajuda na formação de bibliotecas e no aprimoramento da liderança”, explica Amauri.
No ritmo da perseguição
Na África, o Evangelho avança no mesmo ritmo da perseguição religiosa, pondera Marco Cruz, secretário-geral da Missão Portas Abertas no Brasil. “Quando as pessoas veem que os sobreviventes não desistem, não deixam de amar a Deus e de seguir a Jesus, isso serve como um testemunho de que o Senhor que servimos é fiel, leal e ama Seus filhos. Apesar dos ataques e mortes, o cristão perseguido continua vivo em seu testemunho de não negar e permanecer até o fim.”

Conforme Cruz, faltam líderes para servir à Igreja Perseguida em território africano. Ele explica que a Portas Abertas é uma agência missionária que funciona de maneira diferente das demais. A instituição não forma líderes e missionários brasileiros para enviá-los ao campo, mas trabalha diretamente com os cristãos perseguidos em seus próprios países e comunidades. “Queremos que a igreja cresça e se fortaleça onde ela está. É ali que o Evangelho vai crescer, com o testemunho de um nativo da região, de um vizinho, de alguém que fala o mesmo idioma e que cresceu naquele lugar.”
Além disso, a Portas Abertas promove campanhas de oração e apoio socioeconômico, atendendo a necessidades básicas e oferecendo suporte pós-trauma para viúvas, órfãos e líderes cristãos. “Esses líderes recebem apoio pastoral, treinamento e tudo o que precisam para continuar liderando suas comunidades, discipulando novos crentes, auxiliando famílias e, sobretudo, evangelizando”, conclui.

