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quinta-feira, 25 abril 2024

Dia da mulher e seu papel na Igreja

“Creio que falar sobre o Dia Internacional da Mulher dentro de uma perspectiva cristã nos convoca a irmos mais além de um discurso pronto”

Por Ilma Cunha

Devido as comemorações do Dia Internacional da Mulher a articulista Ilma Cunha, juntamente com a revista Comunhão, entrega uma série de três artigos intitulada “Dia da mulher e seu papel na Igreja”.

O dia oito de março é conhecido como o dia internacional da mulher – um especial dia que se ressalta o valor da mulher e sua histórica luta por reconhecimento e melhores condições de vida. Há vários relatos históricos sobre os primeiros movimentos femininos, alguns até mesmo com consequências drásticas, como a história (ou estória) de uma manifestação realizada pelas operárias de uma fábrica em Nova Iorque (há versões distintas para as datas).

Segundo essa versão, a repressão foi violenta e perversa: fecharam a fábrica com as mulheres dentro e atearam fogo. Em torno de 130 mulheres foram queimadas, diz o relato. Esse triste fato marcou a luta das mulheres por respeito, reconhecimento e valorização. A ONU instituiu o dia 08 de março como o Dia Internacional da Mulher e desde então se tornou um dia celebrado pelo mundo.

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O fato é que as demandas femininas por respeito e valorização estão presentes em nosso contexto atual, em todas as dimensões de atuação da mulher, em seus papéis e função familiar. Creio que falar sobre o Dia Internacional da Mulher dentro de uma perspectiva cristã nos convoca a irmos mais além de um discurso pronto, estruturado com objetivos muito bem definidos, que são lançados à público todos os anos nessa data.

Antes de falar sobre o papel da mulher na igreja, quero trazer aqui o que escrevi sobre o desafio da feminilidade em meu livro: Familia-Lugar de Refúgio ou Campo de Batalha? (Editora Central Gospel). Entendo que é na família, no processo de formação, na construção da identidade feminina, na transmissão geracional e na dinâmica relacional da família que o papel da mulher na igreja se configura. A familia é a gênese da igreja no aspecto visível da estrutura eclesiástica e o papel feminino começa ser moldado aí, na construção familiar.

“Com a busca da independência feminina, a mulher entrou na modernidade ocupando espaços que eram exclusivamente dos homens. Se olharmos para trás, vislumbraremos a mulher na segurança de seu lar, cuidando dos filhos e da organização da casa, sem grandes preocupações com os problemas econômicos e financeiros a sua volta. Ela desenvolveu múltiplas habilidades ao dar conta das demandas domésticas e de sua prole. Era uma tragédia para as civilizações antigas perder uma mulher, pois enquanto os homens iam à caça, elas eram as cuidadoras das crianças.

Hoje, sabemos que é inegável a capacidade de trabalho da mulher e o diferencial evidenciado nas múltiplas funções que desempenha. Suas competências e habilidades são ressaltadas e validadas no mundo corporativo e no mercado de trabalho como um diferencial competitivo. Mas, isto não é sem custo.

Qual o preço de atender as demandas do trabalho na busca da qualidade e da excelência e dar conta das demandas familiares? O trabalho exige permanente atualização de conhecimentos e cada vez mais o conhecimento se transformou em moeda de troca no mundo empresarial. O trabalho exige tempo, quantidade e qualidade. E como fica o tempo que se destina ao marido, filhos, lar, vínculos afetivos, rituais familiares, formação das crenças e valores, transmissão da cultura, enfim, todas as demandas que implicam o existir familiar? E a questão desafiadora que se impõe a mulher neste cenário é: Qual o lugar da feminilidade nesta roda viva?

Um estranho mal estar comparece com este questionamento. Podemos nomeá-lo como “O mal estar da feminilidade”. Um profundo mal-estar que percebo através do atendimento clínico a mulheres angustiadas diante das demandas das múltiplas funções a desempenhar.

Sabemos que não basta nascer mulher, do sexo feminino, para advir a feminilidade, visto que se constitui numa transmissão geracional. Uma mulher constrói sua feminilidade em referência a uma mãe, e esta transmissão carrega em si mesma as questões traumáticas dos vínculos e apegos estruturados na relação com a figura materna.

Para uma conjugalidade se firmar, uma conclusão se impõe. Esta experiência humana do início da vida, que se faz no ventre acolhedor e protegido da mãe, um pequeno ninho maravilhoso, é para a criança um paraíso inesquecível, marcado em sua estrutura para sempre. É uma experiência decisiva para o porvir de um ser humano, que traz em si uma ambivalência estruturante, visto que é preciso admitir as perdas primordiais da relação original familiar para dar início a construção da descendência.

Quando se conclui a criança, para a mulher advir, eis a surpresa do retorno: há um “deixar” a se fazer revelado no Gênesis, algo que cobre e re-cobre a tão intrincada questão da feminilidade. Novamente tomamos o texto inicial de Gênesis 3, pois é pela palavra divina dirigida a mulher que se organiza este lugar feminino na conjugalidade: “o teu desejo será para o teu marido”. A saída do Éden impõe uma lei, que não é sem referência e sem significação. E um novo luto se impõe, mais um na sequência de perdas. Porém, a angústia da perda não se desfaz pelo esquecimento e o luto exige a elaboração pela via da palavra, como afirma Julien: (JULIEN, Philippe. A Feminilidade Velada:aliança conjugal e modernidade. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 1997.p.59):

[…] não se faz luto esquecendo… não se realiza o luto do acontecimento senão partindo o pão da palavra, que diz a dor da perda. Não se deixa a origem, a não ser sabendo o que se perde graças a palavra trocada no presente.

É na palavra que o mal estar busca se dissipar…Como definir o mal estar de uma feminilidade? Um nada e um tudo? O nada é da ordem do que ainda está velado na feminilidade, que começa a se desvelar à medida que as angústias se transformam em linguagem, no difícil processo de elaboração feminina, na tentativa de decifrar os sintomas. Mas há um tudo também presente neste contexto, no encontro de um homem e uma mulher, na conjugalidade, onde se funda a próxima geração. Não é por uma simples compreensão que a Palavra de Deus aponta a honra como condição para o cumprimento da promessa de uma vida bem sucedida. Quando buscamos os tesouros da Sabedoria de Deus, abre-se uma compreensão mais além de uma promessa que se estende às próximas gerações.

Ilma Cunha é Teóloga, Psicanalista, Terapeuta Familiar Sistêmica, Consultora e Instrutora de Treinamentos na área comportamental em empresas públicas, privadas e empresas familiares. Diretora da DINAMIZE Assessoria Comportamental Ltda. Possui mestrado e doutorado em Psicologia do Aconselhamento na FCU/Flórida/USA.

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