Sou teólogo, formado há quase 30 anos, mas sempre em formação – orando, estudando e me apegando a Cristo todos os dias.
Tenho um verdadeiro prazer em dialogar com pessoas. Aprendo muito com isto. Nas longas viagens de avião, poder dialogar com quem está ao lado torna-se quase mandatório. Foi numa oportunidade dessas que aprendi algo que agora compartilho com o caro leitor.
Recentemente, viajei ao lado de um senhor já idoso. Cumprimentei-o com um sorriso, logo retribuído por ele, ao qual se seguiu o seu nome e a frase “médico em formação”. “Em formação?” – ingenuamente, retruquei. “Sim” – ele respondeu “40 anos de formado, mas sempre em formação. E você, o que faz?” Minha resposta acompanhou a lição recém aprendida: “Sou teólogo, formado há quase 30 anos, mas sempre em formação”. Rimos gostosamente e seguiu-se um longo e agradável bate-papo.
Como se faz um teólogo? Ainda bem jovem, ao ingressar no Seminário, nutria a convicção de que sairia de lá com a Bíblia decorada, com a solução para quaisquer situações que pudessem surgir na igreja, com todos os conselhos a serem dados, todos os conhecimentos a serem ministrados e uma quantidade suficiente de sermões para pregar por muitos e muitos anos. Pura ilusão!
Recordo bem. No início do curso, tivemos uma cadeira com o pomposo nome de “Propedêutica”, disciplina que nada mais era do que uma visão introdutória de todo o curso de Teologia em suas áreas clássicas: Teologia Bíblica, Histórica, Sistemática e Prática. E logo na primeira aula ouvi: oratio, meditatio, tentatio faciunt theologum, isto é, “oração, estudo e a cruz fazem o teólogo”. Esta máxima vem dos tempos de Lutero e ele próprio praticava e ensinava.
“Teólogos não nascem feitos e nem saem prontos dos Seminários, Institutos, Faculdades Teológicas e Universidades. Teólogos vão se fazendo, se construindo, se formando com as ferramentas que Lutero menciona e das quais fazia uso: oração, estudo e cruz”.
A oração (oratio): teólogos precisam orar sempre e todo o dia, por si mesmos, pelo povo de Deus e pelo mundo, por humildade e por compreensão das Escrituras, de maneira que o Evangelho seja comunicado com clareza, relevância e pureza, e para que ele, o teólogo, glorifique a Deus e ajude o próximo com seu ministério. Orar demonstra a confiança e a dependência que cada teólogo tem de Deus.
O estudo (meditatio): teólogos precisam estudar constante e profundamente a Bíblia. Mas não estudá-la apenas com vistas a adquirir um conhecimento. Lutero vai além. Estudar a Escritura compreende buscar entender, refletir, dialogar com o texto e aplicá-lo a si mesmo e ao universo de situações que cercam o teólogo. Estudar a Bíblia conecta o teólogo com o Autor das Escrituras, alimentando sua fé diariamente.
A Cruz (tentatio): teólogos estão expostos a dúvidas, a dilemas, a frustrações, a desafios muito maiores do que as suas capacidades, a sofrimentos e a tentações, e tudo isto, por causa do Evangelho, pois o anti-Reino não se agrada de ver o Reino sendo construído e faz de tudo para desanimar e desviar os servos que o edificam. Para suportar a Cruz (numa referência clara a Mateus 16.24) é que o teólogo agarra-se firmemente, sempre e de novo, à oração e ao estudo das Escrituras, buscando em Deus fé, esperança e amor para cumprir sua vocação.
Paulo Teixeira é teólogo e linguista, especialista em Língua e Literatura Hebraica e secretário de Tradução e Publicações da SBB.