Da promessa a Abraão à era digital, a transmissão da fé cristã enfrenta desafios e oportunidades para continuar impactando famílias e sociedades
Por Syria Luppi
A influência da fé cristã na formação da cultura ocidental tem sido discutida por muitos autores sob diversas perspectivas teóricas ao longo do tempo. A fé em um Deus criador de todas as coisas, que enviou seu filho Jesus Cristo para resgatar o ser humano da condenação eterna, permeou todos os campos, desde o estritamente religioso até o político.
Ainda hoje, a cultura ocidental carrega valores herdados da tradição cristã, que influenciaram a formação dos cidadãos, a Arte, a Filosofia, a Ciência e a Educação. Além disso, ajudaram a extinguir práticas como a poligamia, a escravidão, o infanticídio e os sacrifícios humanos, entre outras práticas nocivas.
A fé em Deus, transmitida por gerações, tem moldado o ser humano, influenciando-o a amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, inspirando um modelo social sustentado pelos valores de justiça, solidariedade e fraternidade descritos no Evangelho. No entanto, a modernidade e suas influências em campos sociais importantes, como o relacional – onde a hiperconexão digital encurta caminhos, mas também os embaralha -, o afetivo, laboral, familiar, político e religioso, representa um desafio para a perpetuação dos valores da fé cristã.
O legado da fé cristã tem sido sustentado pela vivência comunitária, pelo ensino e pela prática. A secularização da sociedade, a diversidade de crenças e a velocidade da informação impõem questionamentos constantes e “adaptações” do Evangelho, tornando mais difícil a manutenção da fé como um elemento central na vida das novas gerações.
Com isso, torna-se necessária uma comunicação eficiente para os diferentes contextos geracionais como forma de garantir que ela permaneça relevante e eficaz no propósito principal: a salvação e a vida eterna com Cristo Jesus.
Promessa e avanço da Igreja
Deus é geracional. Ele manifesta Seu poder a todas as gerações, como observa-se a partir da história de Abraão. A promessa de abençoar as gerações feita por Deus a Abraão está presente em Gênesis 11.27-25.19 e Gênesis 22.18. Ele prometeu torná-lo uma grande nação, abençoá-lo, engrandecer o seu nome, abençoar os que o abençoassem, amaldiçoar os que o amaldiçoassem, abençoando universalmente todas as nações da terra.
A promessa de Deus a Abraão se cumpriu em Jesus Cristo, descendente direto, por meio de quem o plano de salvação se concretizou. A fé em Jesus torna as pessoas parte da descendência prometida, aliançadas e herdeiras das promessas de Deus (Gálatas 3.7).
Gênesis 17.7 diz: “A aliança que estou fazendo para sempre com você e com os seus descendentes é a seguinte: eu serei para sempre o Deus de você e o Deus dos seus descendentes” (NTLH).
O pastor Kaian Flegler destaca que a aliança de Deus com Seu povo tem atravessado gerações, sendo essencial para o avanço da Igreja. “Como diz o Salmo 145.4 ‘uma geração contará à outra a grandiosidade dos teus feitos; eles anunciarão os teus atos poderosos’. Devemos honrar aqueles que pavimentaram o caminho antes de nós. O Evangelho avançou no Brasil porque homens e mulheres de fé, hoje com 60, 70, 80, cem anos, se posicionaram e foram ousados ao levar a grande comissão adiante. Somos frutos da fidelidade dessas pessoas”.
O Deus que se move por gerações está classificado nas Escrituras como o “Deus de Abraão, Isaque e Jacó” – geração que dá origem ao povo de Israel, povo esse que está na genealogia de Jesus (Mateus 1).
O sentido de família impresso nessa expressão geracional revela a importância que a família tem para Deus. É ela que, depois da salvação eterna, se apresenta como o maior plano de Deus para a humanidade. E é por meio dela que os valores perpassam as gerações na terra.

A fé cristã e os valores espirituais atravessando gerações têm impacto individual e coletivo. Essa é a realidade presente na vida familiar do Pr. João Aparecido Silva. De acordo com ele, a fé em Deus e Seu Filho Jesus é a “identidade” dos seus.
“É uma conexão tão poderosa que é transmitida de forma natural e consciente. As influências da fé marcam em decisões pessoais de vida, comportamentos, propósitos. Creio nisso e vivo isso dentro da minha casa. A fé é que vai conectar cada geração com Deus, por meio de Cristo, e assim como os antepassados venceram e cumpriram propósitos porque decidiram viver em fé, as gerações vindouras também somente cumprirão com eficácia seus propósitos vivendo em fé”, narra o pastor João.
Ele destaca a experiência pessoal nesse quesito. “Eu recebi esse legado de fé dos meus pais. A transmissão desses valores e ensino constante da Palavra de Deus aos nossos filhos, por meio também da minha esposa, pastora Miriam Fernandes, tornaram minha jornada com Cristo tão abençoadora que nossos três filhos – Gabriel, Samuel e Moriá – não abriram mão de dar continuidade ao nosso legado espiritual e ministerial. Atualmente, a nossa igreja sede em Vitória é pastoreada pelo meu filho Samuel, auxiliado por seu irmão, pastor Gabriel Fernandes; já a nossa filha Moriá é pastora em Águas Claras, Brasília, juntamente com seu esposo, William Schwartz. E imensa alegria tenho de ver meus netos firmados nesse caminho”, disse o pastor da Igreja Evangélica Assembleia de Deus Ministério Bethel, em Vitória/ES.

Adaptar a comunicação é fundamental
A transmissão dos ensinamentos cristãos continua sendo um compromisso essencial para muitas famílias e comunidades, que buscam adaptar-se sem perder a essência do Evangelho. No entanto, essa missão se torna cada vez mais desafiadora diante das transformações sociais e tecnológicas que impactam a forma como diferentes gerações se comunicam e vivenciam a fé.
O conteúdo da mensagem cristã permanece inalterado, pois a Palavra de Deus é eterna, mas as formas de comunicação evoluem com o tempo. “No passado, casais trocavam cartas de amor; hoje, enviam mensagens digitais. Mas se a intenção é escrever uma carta de amor, ela será escrita e enviada ao remetente. Assim é nos dias atuais: devemos usar as ferramentas que a tecnologia nos proporciona, mas sempre garantindo que a nossa mensagem aponte para Cristo e permaneça fiel aos princípios da fé”, ressalta o pastor Kaian Flegler.
As gerações mais velhas tendem a valorizar a tradição, mantendo práticas e doutrinas consolidadas ao longo do tempo, enquanto os mais jovens buscam formas de expressar sua fé de maneira mais conectada com a realidade contemporânea.
“Esse conflito geracional pode ser desafiador, especialmente quando os mais jovens desejam inovar na forma de vivenciar e compartilhar a fé, enquanto os mais velhos temem que tais mudanças comprometam os valores fundamentais. Encontrar um equilíbrio entre tradição e inovação é crucial para garantir que a fé continue relevante e sólida em todas as gerações”, destacou a evangelista Sara Regina de Souza Figueiredo Araújo, da Igreja Batista Independente Betel, em Aracruz/ES.
A forma como a fé é comunicada desempenha um papel determinante na receptividade das novas gerações. “A questão tem mais a ver com a forma do que com o conteúdo propriamente dito. Nem sempre a geração mais velha tem sido sábia em comunicar sua fé de modo relevante para os mais jovens. O que eles rejeitam não é a fé em si, mas o modo como ela é transmitida. A igreja precisa compreender que os princípios e valores não mudam, mas a linguagem, as estruturas e a metodologia precisam ser atualizadas. Caso contrário, não se obterá sucesso em alcançar as gerações mais jovens com as verdades eternas da Palavra de Deus”, afirma o Pr. Joarês Mendes, da Primeira Igreja Batista em Jardim Camburi, Vitória/ES.
Diante desse cenário, muitas famílias enfrentam desafios ao transmitir os valores do Evangelho às novas gerações. “São muitas investidas que nossos filhos sofrem neste mundo atual, onde tudo é relativizado, como se não houvesse uma verdade absoluta. E a própria palavra de Deus e Sua sabedoria são loucura para o homem. Então, somos questionados quase que diariamente sobre isso; mantermo-nos constantes e firmes no nosso posicionamento dentro da palavra de Deus é um grande desafio, porque por vezes nós mesmos somos engolidos pelo cansaço, pela rotina, e se não estivermos atentos, o maligno está buscando qualquer pequena brecha para afastar a nova geração de Deus”, destaca a evangelista Sara Regina.
“Então o grande desafio para nós, pais, é sermos constantes no ensinamento, mais do que com palavras: com o nosso exemplo. O grande desafio é sermos o exemplo que nossos filhos vão desejar seguir”, completa Sara, que é mãe de duas filhas e aguarda o nascimento do terceiro.

O caminho a ser trilhado
A secularização da sociedade, a diversidade de crenças e a velocidade da informação impõem questionamentos constantes e “adaptações” do Evangelho, tornando mais difícil a manutenção da fé como um elemento central na vida das novas gerações. Então, como manter o Evangelho relevante para cada geração?
Fortalecimento da fé pela família
Deus é geracional. Ele manifesta Seu poder a todas as gerações, como observa-se a partir da história de Abraão. A promessa de Deus a Abraão se cumpriu em Jesus Cristo, descendente direto, por meio de quem o plano de salvação se concretizou. A fé em Jesus torna as pessoas parte da descendência prometida, aliançadas e herdeiras das promessas de Deus (Gálatas 3.7).
O sentido de família impresso nessa expressão geracional revela a importância que a família tem para Deus. É ela que, depois da salvação eterna, se apresenta como o maior plano de Deus para a humanidade. E é por meio dela que os valores perpassam as gerações na terra.
Adaptação da comunicação
O conteúdo da mensagem cristã permanece inalterado, pois a Palavra de Deus é eterna, mas as formas de comunicação evoluem com o tempo. As gerações mais velhas tendem a valorizar a tradição, mantendo práticas e doutrinas consolidadas ao longo do tempo, enquanto os mais jovens buscam formas de expressar sua fé de maneira mais conectada com a realidade contemporânea. A forma como a fé é comunicada desempenha um papel determinante na receptividade das novas gerações. A igreja precisa compreender que os princípios e valores não mudam, mas a linguagem, as estruturas e a metodologia precisam ser atualizadas. Caso contrário, não se obterá sucesso em alcançar as gerações mais jovens com as verdades eternas da Palavra de Deus.
Manter a constância e ser um exemplo desejável
No mundo atual, onde tudo é relativizado, como se não houvesse uma verdade absoluta, que é o Evangelho, somos confrontados, quase que diariamente nas mais diversas situações e manter um posicionamento constante e firme dentro da palavra de Deus é um grande desafio, porque às vezes somos vencidos pelo cansaço, pela rotina, e se não estivermos atentos, o maligno pode aproveitar qualquer pequena brecha para afastar a nova geração de Deus. Então, o grande desafio é sermos constantes no ensinamento, mais do que com palavras: com o nosso exemplo. Temos que ser o exemplo que nossos filhos desejarão seguir.

