A educadora Cris Poli orienta os pais sobre como identificar e lidar com esse problema social, além de abordar a prevenção
Por Patricia Scott
A educadora Cris Poli, de 75 anos, acaba de lançar o livro “Bullying: como prevenir, combater e tratar”, pela Editora Mundo Cristão. O assunto, bastante atual e relevante, tem impactado a vida de crianças e adolescentes. O problema social não acontece somente no Brasil. Embora o termo tenha sido adotado no país, é um tipo de mal cuja prática vem de longa data. Refere-se a agressões intencionais, que podem ser verbais ou físicas, feitas de forma repetitiva por uma ou mais pessoas contra um ou mais indivíduos.
A idade mais frequente para a manifestação do bullying é entre 11 e 15 anos, ou seja, no início da adolescência, segundo Cris Poli, o que não significa que crianças menores não pratiquem bullying. No entanto, quando ocorre entre os mais novos, é com muito “menos intensidade, frequência, maldade e agressividade”. A faixa etária de 11 a 15 anos é caracterizada por insegurança, diz ela, em razão das mudanças que ocorrem física, emocional e psicologicamente nos indivíduos. “Isso os leva a querer descobrir quem são e qual é seu lugar na sociedade, o que, em pessoas com certas características, acontece mediante a manifestação desse comportamento opressor”.
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Em entrevista à Comunhão, Cris Poli destaca aspectos importantes do assunto, trazendo luz a questões que envolvem vítimas e agressores. A obra, como a própria educadora afirma, é uma maneira de alertar e orientar os pais para o problema que, muitas vezes, não é compartilhado pelos filhos, quer estejam ou não vivenciando a dor do bullying.
O que motivou a senhora a escrever um livro sobre bullying?
A realidade dos relacionamentos, na atualidade, que é marcada por provocações, apelidos e agressividade. Isso acontece entre crianças, adolescentes, jovens e adultos. A minha intenção é ajudar os pais a detectar mudanças de comportamento no dia a dia dos filhos e, assim, perceber que algo está acontecendo. Existe alguma situação por trás, que precisa ser identificada. É um alerta para as famílias, os pais, os professores e os educadores, a partir de orientações para prevenir, combater e ajudar as vítimas na superação do problema.
O que caracteriza o bullying?
O bullying é caracterizado pela violência, agressão, humilhação, sendo um problema mundial. O agressor se sente superior à vítima. As provocações sempre existiram, os apelidos, mas a sociedade mudou. Está muito violenta. Crianças, adolescentes e jovens ficam facilmente irritadas e partem para a agressão. O bullying é uma atitude que tem a intenção de machucar a outra pessoa, física ou emocionalmente (ou os dois).
Como prevenir o bullying?
Os pais devem conversar desde cedo com os filhos sobre tudo o que tem a ver com bullying e incentivá-los a informar sobre casos que testemunhem ou dos quais venham a ser vítimas. Também é muito importante estimular e valorizar entre as crianças qualquer atitude que seja tomada por elas no intuito de evitar o problema, como respeitar os outros, tolerar as diferenças, receber bem as opiniões divergentes e não impor pontos de vista. Os pais precisam trabalhar desde cedo esse assunto com as crianças, estabelecendo regras de disciplina — primeiro, em casa e, depois, na escola, para que haja coerência entre as regras impostas e as atitudes dos adultos.
O bullying acontece mais entre meninos ou meninas?
A prática acontece mais entre meninos que meninas. No meio dos meninos, o bullying é mais caracterizado por agressão física, violência, irritação com apelidos e outras ações que têm como objetivo — mesmo inconsciente — diminuir a autoestima do agredido. Entre as meninas, ocorre com menos frequência e tem características diferentes, porque, junto ao sexo feminino, o bullying se manifesta mais na forma de fofocas, isolamentos, ciúmes, cochichos depreciativos e atitudes similares. Tudo isso leva as meninas ao isolamento e à retração e, consequentemente, gera dificuldade de estabelecer vínculos reais de amizade.
Quais as características do menor que pratica o bullying?
As crianças e os adolescentes que praticam bullying apresentam características em comum. Costumam ser indivíduos hostis, agressivos e, em sua maioria, sofreram bullying quando eram menores. O ambiente familiar deles
tende a ser permissivo. Os pais apresentam dificuldade de impor limites e dispor de tempo de qualidade para estar com os filhos. São ambientes difíceis, onde ocorrem brigas por qualquer coisa, com agressões verbais ou físicas.
Qual o perfil das vítimas do bullying?
As vítimas do bullying, por sua vez, também apresentam características semelhantes entre elas. Geralmente, são crianças ou adolescentes quietos, passivos, que não tomam iniciativa, inseguros, com baixa autoestima, ansiosos e solitários. Muitos foram abandonados ou deixados de lado pela família. Sem receber a atenção devida, acabam adotando atitudes que os levam a ser abandonados socialmente. Em grande parte, são crianças que choram muito e por qualquer motivo, até mesmo sem causa aparente. São retraídas, caladas e introvertidas, do tipo que sofre em silêncio e não se comunica de maneira regular com os adultos e outras pessoas da mesma idade.
O que estimula o bullying entre crianças e adolescentes?
Filmes, desenhos, internet, como também a vivência em ambientes violentos. Eles são alimentados, diariamente, por diferentes canais que estimulam a agressividade. Violência gera violência.
Qual a diferença entre o bullying praticado por familiares e por colegas?
A diferença entre o bullying imposto por familiares e aquele que é praticado por pessoas de fora é que dentro da família há uma quebra de confiança, uma atitude que as crianças não esperam que aconteça, por se tratar de um ambiente que deveria ser o porto seguro delas. Se vierem a ser agredidas dentro da família, isso mexerá muito mais profundamente com suas emoções e o sofrimento será muito maior.
Quais os principais danos causados pelo bullying?
A vítima fica cada vez mais retraída, distante, afastada de tudo, introvertida, ensimesmada. Afeta terrivelmente a personalidade da criança ou do adolescente, principalmente pelo fato de que estão na fase da vida de pleno desenvolvimento. Causando insegurança, retração, emocionalismo exacerbado (pessoas que choram por qualquer coisa) e dificuldades de relacionamento. As vítimas de bullying têm grandes chances de se tornarem pessoas que terão dificuldade de conversar, se expressar e compartilhar o que estão sentindo ou pensando.
Como os pais conseguem identificar se os filhos são vítimas de bullying?
As mudanças de comportamento são um indicativo. A criança ou adolescente alegre, extrovertido, de repente, fica introvertido, não deseja mais participar das atividades e ainda demonstra dificuldade de interação. O filho que se alimenta bem passa a não querer comer, ou ao contrário. Se o adulto conhece a criança, o adolescente, saberá identificar as transformações comportamentais.
Como ajudar o filho vítima de bullying?
Aproximando-se, conversando, ganhando a confiança dos filhos para que eles falem sobre a situação. Muitas vezes, o menor fica com medo de contar, justamente por que não conseguiu se defender. Então, fica receoso com as críticas. É importante que os pais conquistem a confiança dos filhos, para que haja um diálogo franco.
O agressor também precisa de ajuda?
Com certeza. Geralmente, o agressor esconde algo. É vítima de atos violentos ou de abusos. Se o filho é o agressor, os pais não podem ignorar. Precisam conversar e, se for o caso, buscar ajuda especializada. As crianças e os adolescentes que praticam bullying sentem prazer nessa atitude, por desejo de descontar em alguém a dor das agressões e humilhações que sofreram ou da violência doméstica. Eles se alegram em canalizar essas frustrações e descarregá-las sobre outras pessoas. O agressor precisa de tanta ajuda quanto o agredido, porque suas atitudes demonstram que ele não sabe se relacionar com os companheiros e, por isso, entende que tem de impor sua vontade por força, violência, agressão verbal, agressão física, desmoralização do outro.
Para finalizar, deixe um recado para os pais.
Assuma a responsabilidade da educação dos seus filhos, para que eles enfrentem as dificuldades que são impostas às novas gerações. É preciso passar tempo juntos, para que haja ocasiões de ensinamento. O problema do bullying é sério, e a responsabilidade da educação dos filhos é dos pais. Existe um versículo na Bíblia que serve como o principal cuidado que os pais devem ter com os filhos, para que evitem que eles se tornem vítimas do bullying. “Ensine seus filhos no caminho certo, e, mesmo quando envelhecerem, não se desviarão dele” (Provérbios 22.6). Essa é uma atitude essencial ao processo de educação e deve ser posta em prática.