Os projetos focam no tratamento integral do indivíduo – corpo, alma e espírito – com base nos princípios bíblicos
Por Patricia Scott
Dados do Relatório Mundial sobre Drogas de 2024 revelam que o número de pessoas que usam drogas aumentou para 292 milhões em 2022, um aumento de 20% em 10 anos. A cannabis continua a ser a droga mais consumida em todo o mundo (228 milhões de consumidores), seguida pelos opiáceos (60 milhões de consumidores), pelas anfetaminas (30 milhões de consumidores), pela cocaína (23 milhões de consumidores) e pelo ecstasy (20 milhões de consumidores). O levantamento mostra ainda que embora cerca de 64 milhões de pessoas em todo o mundo sofram de transtornos relacionados ao uso de drogas, apenas uma em cada 11 está em tratamento.
No Brasil, segundo estudos da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 6% da população faz uso de algum tipo de droga, o que representa mais de 12 milhões de pessoas dependentes químicos. A dependência química é caracterizada pelo consumo excessivo e descontrolado de substâncias que comprometem a saúde e o bem-estar físico e mental do indivíduo. Com o uso contínuo, a pessoa pode desenvolver um padrão comportamental patológico, além de alterações físicas e psiquiátricas.

Dentro desse complexo cenário, a igreja tem desenvolvido um papel importante no enfrentamento ao consumo de drogas, tanto na prevenção quanto na recuperação de dependentes químicos. A Junta de Missões Nacionais, por exemplo, há 15 anos desenvolve o programa Cristolândia, que atua, principalmente, junto aos dependentes químicos que moram nas ruas. A iniciativa está presente em Alagoas, Pernambuco, Bahia, Distrito Federal, Goiás, Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná.
“A Cristolândia é um programa de reinserção social, não de desintoxicação”, explica Milton Milton Monte, gerente-executivo de Comunicação e Mobilização, da Junta de Missões Nacionais. Ele detalha que a base do trabalho é a oração, o discipulado e acolhimento da pessoa, aceitando a todos com seus problemas e histórias. “O processo em si é composto, basicamente, de duas etapas. Na primeira, o indivíduo deixa de usar a droga, e na segunda, ele é reinserido à sociedade.”



Milton comenta que a luta contra o vício é muito grande. “Para um ser humano passar a morar nas ruas, comer lixo, dormir no papelão, ele perdeu muito de sua vida, de sua dignidade. Recuperar sua vida de volta, por completo, é o grande desafio. É preciso a ação do poder do Espírito Santo.”
O programa oferece alguns projetos aos atendidos que fazem parte do processo de recuperação da pessoa como, por exemplo, o “Sons da Missão” e “Coral Cristolândia”, que apoiam o processo terapêutico a partir da música, e “Sonho de Mãe”, dedicado a acolher mulheres em situação de rua e que tenham filhos menores de idade. Há ainda a “Casa do Estudante”, que acolhe aqueles que estão aptos a esta fase do programa que possibilita o ingresso na universidade. Além disso, o “Viver” tem como foco a prevenção às drogas com foco em crianças e adolescentes.

Novos começos
No interior de São Paulo, em São Lourenço da Serra, o Desafio Jovem Ferreira (Dejofe) tem como propósito resgatar vidas que foram dominadas pelo álcool e pelas drogas e possibilitar um futuro digno, com base na Palavra de Deus. O projeto está ligado à Assembleia de Deus Ferreira (ADF), na capital paulista, onde ocorre a triagem daqueles que precisam de tratamento. O trabalho vem sendo desenvolvido há quase 30 anos. Hoje, a instituição atende a 16 homens.
“O processo de recuperação é todo pautado no Evangelho. Então, há cultos três vezes ao dia, manhã, tarde e noite, como também aconselhamento pastoral e momentos de oração”, explica o pastor Leandro Rodrigues, responsável pelo Dejofe. Além disso, acontecem atividades, que funcionam como terapia ocupacional. “E tem os períodos de lazer na piscina e também jogos de futebol com dias e horários estabelecidos.”
De acordo com o pastor Leandro, é importante que a família participe do processo de recuperação. Por isso, ao longo da semana, o interno tem direito de ligar duas vezes para casa. “A família também pode entrar em contato, semanalmente, três vezes, e uma vez ao mês realizar visita.”

Leandro observa que os internos carregam traumas e dores e, muitas vezes, há a necessidade de acompanhamento psicológico e até psiquiátrico. Como não há esses profissionais no Dejofe, eles são acompanhados por atendimento externo, sempre na companhia de uma pessoa do projeto. “O tempo de tratamento é de seis meses. No entanto, são livres caso queiram sair antes. Isto porque é importante que a pessoa tenha consciência da sua condição e deseje ajuda.”
No Rio de Janeiro, há cinco anos, a Comunidade Terapêutica Mais Que Vencedores disponibiliza atendimento para a recuperação de dependentes químicos. Atualmente, o espaço, localizado na zona rural de Itaboraí (RJ), tem capacidade para acolher 30 residentes, mas com potencial para chegar a 120.
“Dispomos de diversos psicólogos parceiros que de maneira voluntária e gratuita nos ajuda no processo de tratamento”, explica o pastor Ary Inarra Neto, responsável pela comunidade, que é mantido pelo Instituto Assistencial Atitude ligado à Igreja Batista Atitude.
Ary explica que o tratamento tem duração de sete meses. No entanto, segundo o pastor, “como a dependência química é uma doença que não tem cura, quando eles saem da comunidade precisam fazer manutenção. Temos grupos de apoio e estimulamos que estruturem também rede de apoio.”
O pastor lembra que é um desafio fazer com que a sociedade deixe de olhar de maneira preconceituosa para esses homens que têm uma doença, que não tem cura. Ary também destaca a necessidade dos familiares aprenderem sobre a doença, que tem devastado muito lares e, muitas, vezes o problema está dentro de casa.