O levantamento mostra ainda que 63% dos católicos não concordam com as apostas online; e 2% dos brasileiros enxergam a prática como investimento
Por Patricia Scott
Recente pesquisa do Datafolha mostra que 66% dos evangélicos e 63% dos católicos são contrários às apostas esportivas na internet, conhecidas como bets. Além disso, o levantamento revela que quase dois a cada três brasileiros com 18 anos ou mais defendem a proibição. No entanto, o número sobe para 78% quando a questão se restringe aos caça-níqueis online, como o Jogo do Tigrinho, mantidos também na web.
Na opinião do pastor Daniel Guanaes, da Igreja Presbiteriana do Recreio, na zona oeste do Rio de Janeiro (RJ), simplesmente pregar que participar de jogos de azar é pecado não é o suficiente para promover uma mudança efetiva de comportamento entre os fiéis. Ele acredita que o papel da igreja, como formadora de opinião, é conscientizar os membros utilizando uma linguagem que os ajude a entender os efeitos prejudiciais do vício em jogos.
“A igreja pode se tornar um espaço dentro de seu ecossistema para mostrar às pessoas como essas atividades geram vício e dependência, e os danos que isso causa aos relacionamentos, à saúde financeira e à segurança”, opina Daniel, que exemplifica: “Quem não tem dinheiro e acaba pegando emprestado para apostar pode acabar sendo ameaçado. Existem desdobramentos muito graves”. Assim, o pastor acredita que, se “a Igreja organizar palestras e encontros para conscientizar sobre esse problema, há grandes chances de ser eficaz em ajudar os membros e a sociedade a evitar esse caminho.”
A pesquisa Datafolha revela ainda que, além da maioria da população (65%) ser contra a liberação dos jogos, 54% consideram as apostas um vício, enquanto 30% veem como uma perda de dinheiro. Entre os 15% que têm uma visão positiva sobre a prática, 9% a consideram uma forma de diversão, 3% acreditam que pode ser uma fonte de renda e 2% a enxergam como um investimento financeiro.
No entanto, o financista Rodrigo Coutinho explica que investimento consiste na aplicação de recursos, como dinheiro, tempo ou esforço, com o objetivo de obter um retorno ou lucro no futuro. Em essência, trata-se de “colocar o dinheiro em algo que se espera que valorize ao longo do tempo, como ações, imóveis ou até mesmo um negócio”. O intuito é aumentar o capital ou garantir uma rentabilidade, que pode ser financeira ou de outra natureza, dependendo do tipo de investimento.
Rodrigo ressalta também que as apostas, embora envolvam dinheiro e a expectativa de ganho, não são consideradas investimentos. Isso ocorre porque elas dependem principalmente da sorte e do acaso, sem uma base sólida de análise ou geração de valor consistente. “Ao contrário dos investimentos, onde há uma lógica de crescimento e retorno planejado, as apostas são arriscadas e não oferecem garantias, sendo mais uma forma de entretenimento do que um meio de construir patrimônio”, conclui.
Aposta entre endividados
Diante da crescente adesão às bets, a Serasa realizou, em outubro, a pesquisa “A Relação dos Inadimplentes com as Apostas”, em parceria com o Instituto Opinion Box. O estudo aponta que, no país, cinco em cada 10 endividados já fizeram pelo menos uma aposta, e 34% deles continuam apostando, atualmente.
De acordo com o estudo, entre as principais razões para começar a apostar, segundo os entrevistados de todo o Brasil, destacam-se a tentativa de obter dinheiro rápido para pagar contas (29%) e a busca por uma renda extra (27%). Além disso, 44% dos endividados que já apostaram relatam ter jogado justamente com o objetivo de quitar uma dívida.
Os dados da pesquisa, que ouviu 4.463 consumidores endividados, são alarmantes. Por isso, a Serasa produziu um manual de alerta: “Guia Serasa de Bets e Apostas Online: Como Evitar que o Entretenimento Afete a Saúde Financeira”. Ele não tem o objetivo de julgar os apostadores, mas alertá-los sobre os riscos e os cuidados com as finanças.
Diante desse cenário preocupante, a especialista em educação financeira Francilene Santos destaca que uma das principais condições na vida do cristão é viver em total dependência de Deus e agir como mordomo de Seus recursos. Ela alerta que, quando o assunto é aposta esportiva, o cristão deve ter cuidados redobrados, não apenas pelos prejuízos financeiros, mas principalmente pelo enfraquecimento espiritual.
“A Bíblia nos ensina que tudo o que temos vem de Deus. Em 1 Crônicas 29.14, somos lembrados de que o Senhor é a fonte de todas as bênçãos, e devemos depender totalmente Dele para nossas necessidades, segurança e provisão”, enfatiza. Ela observa que, ao buscar ganhos rápidos e fáceis por meio do jogo, o cristão, de certa forma, nega essa dependência e coloca sua confiança na sorte, e não em Deus.
Já o professor e doutor em Ciências Sociais, Élcio Sant’Anna, acrescenta que jogos virtuais, como as apostas, podem levar a pessoa a desenvolver compulsividade, inclusive em outras áreas da vida. “O problema é que a compulsividade impede a pessoa de organizar seu tempo. Ela vai ganhando cada vez mais espaço, e, de repente, várias coisas ficam completamente fora de controle”, alerta.
Ele explica ainda que o jogo funciona como um gatilho para a concupiscência, um dos maiores desafios do ser humano. “Chegará um momento em que precisaremos tratar esses jogos online de ganha e perde como um problema de saúde pública”, conclui.
Desde o ano passado, a Comunhão chama atenção para os efeitos devastadores que as bets têm causado à sociedade brasileira, inclusive destacando o impacto na vida cristã. O tema, inclusive, esteve na capa da edição 319 da revista, além disso Comunhão Debate chamou atenção para “A destruição das famílias pelas bets: o que a Igreja pode fazer?”.
Para outras informações, confira os conteúdos abaixo:
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