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terça-feira, 19 março 2024

Aprender a perder

Sentimentos como perdas e frustrações não são exclusivos de adultos. As crianças também têm de lidar com situações decepcionantes desde cedo, e os pais são desafiados a orientar os filhos para que eles se fortaleçam.

Mas como lidar com essas emoções ajudando-os a crescerem e não se sentirem derrotados?Decepção, frustação, sentimento de fracasso são emoções que podem nos rodear diante de um mundo de cobranças diárias por mais sucesso e realização, mas não são frutos da modernidade. Davi já manifestava o abatimento quando disse: “Por que estás abatida, ó minha alma, e por que te perturbas em mim? Espera em Deus, pois ainda O louvarei pela salvação da sua face” (Sl 42:7).

No caso das crianças, a decepção é importante para o amadurecimento. Por isso, é importante que elas aprendam como lidar com as frustrações. Os pais são responsáveis pela construção do caráter moral e espiritual dos filhos e devem ajudá-los a passar por essas emoções sem que elas desenvolvam baixa autoestima e, no futuro, busquem nos vícios mecanismos para lidar com essa dificuldade. Para o autor do livro “Psicologia da Criança”, Arthur Jersild, as emoções estão relacionadas à maturidade desde a primeira infância, quando a criança começa a administrar parte da sua vida. E por isso Jesus Cristo alertou: “No mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo eu venci o mundo” (Jo16:33). Ele também exorta: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vô-la dou como o mundo a dá. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize” (Jo14:27), pois sabia que em todos os tempos os homens passariam por aflições.

Arthur Jersild ressalta a importância de que os responsáveis pela criança as ajudem nos momentos de frustação, decepção ou angústia a entender a situação e ver como pode tirar proveito dela. “A criança que se aceita a si mesmo tem liberdade de cultivar seus próprios interesses sem ser escrava de todas as expectativas sobre ela”, afirma o autor. A Palavra de Deus nos exorta a falar dos nossos problemas, apresentá-los a Deus e crer que Ele pode, como um bálsamo, modificar o que está no coração e na alma. Ter fé é uma decisão diária, e ela precisa ser alimentada com a leitura da Bíblia, oração, compartilhamento e estudo. Davi apresenta Deus como um alto refúgio em tempos de angústia (Sl. 9:9-10).
Lemos em Co. 4:8-9, que em tudo somos atribulados, mas não angustiados, perplexos, mas não desamparados, abatidos, mas não destruídos. E estas são as palavras que devemos repassar aos nossos filhos, pois como Davi afirma em Sl 1267:3. “Os filhos são herança da parte do Senhor”. Uma dádiva, um presente e precisa ser bem cuidado.

É errado ficar frustrado?

Muitos são os versículos que falam da paz em Deus, como Sl 119:165, Fl. 4:6-7, Hb. 10:35. A questão é: para alcançarmos paz, temos que entender que nossos caminhos podem não ser os que Deus escolheu para nós, como afirma Pv. 13:12 e Ec. 3:1. Precisamos ser como Davi quando disse: “Entrega teu caminho ao Senhor, confia nEle e o mais Ele fará” (Sl 37:5). Mas se deixarmos a frustação ou a decepção crescer, ela pode nos levar à autocomiseração, a ponto de nos sentirmos diminuídos e com a autoestima baixa, aponta Rinaldi, que ressalta a ideia de que se deve amadurecer com a aparente derrota de uma expectativa frustrante, pensando “Não era meu momento”, tal qual fala Paulo: “Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o Seu propósito” (Rm8:28).

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Os pais e os responsáveis são muito importantes quando os filhos passam por momentos de decepção, fracasso ou frustação e para isso devem ser exemplos e estar dentro da vontade de Deus, afirma o pastor da Igreja Batista em Santa Rita, em Vila Velha, Walter Santos. Ele entende que o fato de que não ser bem-sucedido em um empreendimento na vida não significa ausência de fé. “Muitas vezes, Deus permite certas circunstâncias em nossas vidas, como crescimento, conforme lemos em Rm8. Penso que a falta de fé pode levar ao fracasso”.  Para o pastor Walter, a melhor forma de ajudar o filho a enfrentar a frustração, a decepção ou o fracasso é apresentar a ele a questão da humanidade. “Em alguns momentos em nossa vida, como pais, tivemos essas emoções, e nem por isso fomos vencidos. Logo, por meio de diálogo e do nosso exemplo como pessoas que buscam estar no centro da vontade de Deus, podemos ajudar nossos filhos”.  Os pais, também, devem estar atentos ao tempo dos filhos quanto às emoções. A melhor ajuda é a amizade, é um relacionamento real. “A questão é a qualidade dos pais, pois melhor do que ninguém vão saber quando devem abordar os filhos quando passarem por essas emoções. Há aquele filho que pede logo ajuda, e outro que precisa de um tempo, quieto. Se os pais tiverem um bom relacionamento com os filhos, saberão como agir”, afirmou.

Frustrações começam cedo

Na opinião da psicóloga Quésia Cunha, as crianças começam a ter frustações logo que nascem. “Quando a mãe define o período de tempo para alimentar e não permite fazer isso a cada choro, já está frustrando a criança. É importante que seja assim para criar a disciplina necessária para mãe e filho”. Quésia vê que, normalmente, os pais têm dificuldade em frustrar seus filhos nas situações de vida diária. “A frustração faz parte do processo de humanização e estruturação da criança. É por meio da frustração que se aprendem as regras de convivência e os limites para o amadurecimento e para a vida adulta, senão criam-se pequenos ‘monstrinhos’ que acham que podem tudo e ficam despreparados para as frustrações que enfrentarão quando crescerem”.

A psicóloga concorda que os pais ou responsáveis são peças importantes no trato dos filhos diante de fracassos ou desilusões, reforçando a confiança e autoestima deles, como conversar e dar atenção ao processo que estão vivendo naquele determinado momento.  “É importante conhecer a dimensão que a criança está dando para o problema, porquanto pode estar superdimensionada ou valorizando demasiadamente uma situação negativa. Colocar os problemas na perspectiva adequada por meio do resgate das situações positivas é que pode equilibrar o momento, mas, sobretudo acolher, ouvir, deixar que expressem seus sentimentos. Garantir apoio para que os filhos tenham convicção que nunca estarão sozinhos, e assim transmitir a importância da transitoriedade da vida e das experiências doídas”, afirmou.

Quésia ressalta que há indícios que indicam se o filho está sofrendo, quando a tristeza ou frustração se alongar ou for desproporcional à experiência. “Além do choro, da tristeza e da raiva, quando o processo começa a interferir na vida diária, como ir mal na escola, distanciar-se das pessoas, ficar hiperativo ou melancólico, comer demasiadamente ou não querer comer, fazer xixi na cama, indícios que a criança não está sabendo lidar com a dor ou frustração, é importante nessa procurar ajuda de um profissional”, afirmou.

Identificando situações

Shirlei Araújo Reis, missionária da Associação Pró-Evangelização de Criança (Apec), que atua em São Paulo, orienta aos pais, quando os filhos estiverem passando por emoções como decepção ou frustação, a buscarem orientação de Deus. “Em primeiro lugar orar com e pelos seus filhos; aconselhá-los segundo a Palavra de Deus e, junto a isso devem ajudá-los”. Ela entende que estar frustrado não quer dizer falta de fé. “Pelo contrário, quando passamos por decepções e/ou frustrações, e buscarmos a solução na Palavra de Deus, na conversa com crentes maduros poderemossair mais fortalecido em nossa fé”, afirma.
Para Shirlei, os pais ou responsáveis devem buscar identificar o que está acontecendo com seu filho. “Entendo que um pai pode ajudar seu filho, observando situações em que ele tem mudanças bruscas de comportamento como comer muito ou perder o apetite; medo exagerado; carência exagerada, ou prefere ficar sempre isolado das demais pessoas; há quedas nas notas escolares e junta-se a grupo de amigos diferentes do normal e que lhe ofereçam perigo. Essas situações devem ser tratadas com diálogo e amor”.

Em seu trabalho na evangelização de crianças, Shirlei encontra algumas decepcionadas e frustradas. E para alcançá-las apresenta o amor de Deus, por meio de histórias bíblicas sobre pessoas que passaram por situações semelhantes. “Também cantamos músicas que falem desses problemas e da solução em Deus, assim como do valor que elas têm aos olhos de Pai, além de abraçarmos e conversamos muito de forma individualizada”.

Conversar

Para a professora de Biologia Priscila Merçon, da Igreja Maranata da Enseada do Suá, Vitória, a melhor forma de lidar com as frustrações dos filhos é o diálogo. “Eu sempre converso muito com eles com amizade, respeito e carinho”.  Recentemente Priscila perdeu o pai, e isso foi um momento difícil para a família, principalmente, porque os filhos eram muito ligados ao avô. “Foi muito difícil. O Matheus (10 anos) perguntou se o avô estava bem? Disse que ele havia morrido, mas estava com Deus. Ele ficou por umas duas horaspensativo e depois chorou. Acredito que consegui passar tranquilidade para ele, força essa que veio de Deus”. “Já o João (4 anos) disse que o vovô virou uma estrelinha no céu e está com Jesus”.
Priscila acredita que os pais devam, cada vez mais, ser amorosos e amigos, pois é o que os manterá junto à família. “O diálogo, o carinho, o amor, é fundamental, e como educadora e mãe também percebo que o exemplo é primordial. Nós educadores e pais somos os exemplos que eles seguem”.

A professora não vê a frustação como ausência de fé. “Às vezes me sinto frustrada, pois este mundo é muito difícil, e não vejo que frustação como falta de fé, apenas uma fraqueza humana que todos passamos, mas para quem tem uma vida nos caminhos de Deus, logo Ele renova nossa alegria”.

Expectativas reais

Para a escritora e professora Kátia Tinoco Castro, a frustação muitas vezes ocorre porque o que se quer ou se planeja não é aquilo que Deus projetou. “E até tomarmos consciência à frustração acontece. Agora persistir na frustração, ai sim é falta de fé”. Com relação a trabalhar as decepções ou frustações com os filhos, ela, também, utiliza o diálogo. “Converso com meus filhos, ensinando-os a fazer o melhor, o correto e esperar pouco de outras pessoas, mas não deixo de alertá-los que o fracasso e a decepção fazem parte da vida da gente, mas que Deus é acima de tudo isso”.

Kátia entende que os pais não devem criar expectativas não reais em relação aos filhos, mas aceitar o que são: “Sempre queremos que nossos filhos sejam os melhores alunos, as melhores pessoas e, principalmente, esperamos que eles não sofram, mas nossos filhos também não são perfeitos, o melhor é enxergar o melhor de cada um. Não espere das pessoas, procure fazer, entenda, oriente e ajude”.


Esteja disponível para seu filho

No caso de fracasso escolar:
• Acompanhar nos afazeres escolares.
• Conversar com os professores para saber como seu filho se comporta na escola (descobrindo se é falta de atenção e/ou concentração; mau comportamento).
• Exigir aquilo que está ao alcance deles e não o que desejam que eles sejam. (Ex. não exigir somente notas altas e em todas as matérias).
• Incentivar seus pequenos avanços.

No caso de desilusões com amigos:
• Conversar sobre como ele trata seus amigos.
• Ler histórias bíblicas sobre amigos (Ex.: Jesus com seus discípulos – no final todos o decepcionaram).
• Tornar-se seu melhor amigo e apresentar-lhes o Amigo Fiel – Jesus.
• Falar sobre sua experiência sobre o assunto.

No caso de morte:
• Procurar tratar a morte com naturalidade, lembrando que todos nós passaremos por ela (a menos que Cristo volte antes).
• Ler pra eles passagens bíblicas que falem de pessoas que morreram (isso antes que aconteça algo assim).
• Permitir que chorem bastante ou aceitar o silêncio e ser paciente com sua possível agressividade.
• Ensiná-lo que a morte do crente é um ganho, visto que morará com Jesus pra sempre.
• Conversar a respeito da morte antes que ele tenha alguém de perto que morra.

A matéria acima é uma republicação da Revista Comunhão. Fatos, comentários e opiniões contidos no texto se referem à época em que a matéria foi escrita.

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