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sexta-feira, 19 abril 2024

A igreja e a crise

O mundo passa por uma turbulência econômico-financeira sem precedente e as igrejas, é claro, também sentirão os efeitos da crise, seja nas vidas de seus membros – alguns já desempregados, outros ameaçados de engrossar essa estatística, outros, ainda, proprietários de empresas em dificuldades – seja no próprio dia-a-dia da sua gestão: custos em alta, receitas em baixa, crédito escasso e juros proibitivos. Como enfrentar as “vacas magras” que se desenham no horizonte do próximo ano?

A Bíblia conta em Gênesis que José, filho de Jacó, foi o líder que administrou o Egito durante uma grave crise, um período no qual houve fome sobre aquela terra. O Faraó teve um sonho em que vacas gordas pastavam à beira do Rio Nilo, e logo em seguida sete vacas magras e feias subiram do mesmo rio, mas para atacar e comer as vacas bem nutridas.

O Egito era uma terra próspera. Mesmo assim, José interpretou aquele sonho como sendo a metáfora de “sete anos de fartura seguidos de sete anos de escassez”. Faraó o instituiu então como autoridade para conduzir aquele povo durante este período. José planejou e resolveu controlar estoques de comida ajuntados durante um período de abundância de produção, para que estes fossem suficientes para vencer a privação.

A importância de conseguir administrar bem estes momentos é tanta que até mesmo Faraó abdicou de ele próprio gerenciar aquela tensão, deixando a responsabilidade para alguém que reconheceu mais capacitado para isto. Afinal, José havia sido “avisado” por Deus sobre o que aconteceria. Diga-se de passagem, o filho de Jacó foi tão bom administrador que o Egito emergiu daquela dificuldade como uma poderosa nação.

Guardadas as proporções, o mundo passa atualmente por uma crise que tem sido comparada por estudiosos de história e economistas à crise de 1929, conhecida como a Grande Depressão. Naquele ano, empresas passaram a valer nada, e milhares de pessoas perderam seus empregos por causa da diminuição da produção, passando fome e privações. Em conseqüência disto, a década de 30 foi um período de dificuldades, mas também de retomada.

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Hoje o mundo passa por uma turbulência econômica que, em sua origem, tem outro motivo: falta de confiança. Nenhuma instituição financeira quer emprestar dinheiro para outra ou para indústrias e empresários. Isto significa menos dinheiro girando e menos investimentos, pois apenas quem possui dinheiro conseguirá realizá-los.

A crise de confiança teve início no sistema de crédito imobiliário dos Estados Unidos, que lá corresponde a 70% do Produto Interno Bruto (PIB), estimado em US$ 8,2 trilhões. O PIB é a soma de todas as riquezas de um país. Dessa forma, é possível imaginar quanto os americanos devem às instituições financeiras. “A crise aconteceu em virtude da importância do crédito imobiliário para os Estados Unidos e daquele país para o restante do mundo”, explicou Jeferson Won Rondon de Souza, membro da Igreja Batista da Praia do Canto, em Vitória, engenheiro e mestre em Economia formado pela Ufes, e também diretor do movimento Líderes para as Nações (LNI).

“Talvez a crise venha a revelar a superficialidade cultivada por anos a fio, nos mostrando onde realmente estamos e para aonde precisamos ir”
Ubirajara Crespo, pastor e editor da Editora Naós

“Já estamos vivendo a crise. Temos empresas com paralisações programadas e férias coletivas anunciadas”, comentou Jeferson, para quem o ano de 2009 será um dos mais difíceis, pois representa o momento de retomada de crescimento.

O pastor Luciano Estavam Gomes, da Primeira Igreja Batista de Aracruz, conta que em sua comunidade, apesar de as dificuldades ainda não serem aparentes, existem pessoas que perderam recentemente os empregos e outras que estão sob aviso prévio de demissão.

Uma crise sem fronteiras

As igrejas, claro, sentirão os efeitos desta crise. O primeiro impacto será a receita menor, por causa da diminuição no recebimento de dízimos e ofertas. “As igrejas devem se preparar para cortar custos fixos, como salários, aluguéis, água, luz, telefone. Seria um bom momento para utilizar alguma reserva, se elas as possuírem e apenas se for necessário”, aconselhou Jeferson, explicando que os primeiros cidadãos a sentir os efeitos serão os que trabalham ganhando comissão; depois, dependendo do número de desempregados que têm trabalhos formais, a crise pode se agravar para as igrejas. As mesmas dicas valem para as pessoas físicas. É hora de “apertar o cinto” e economizar o que for possível.

“Se a crise se avolumar, mais do que nunca a igreja precisará atuar como auxiliadora financeira, emocional e espiritual daqueles que precisarem”, disse Jéferson, ressaltando que o Espírito Santo passa por um bom momento econômico, no qual estão sendo realizados grandes projetos e investimentos, tanto públicos quanto privados, o que deve, de alguma forma, colaborar para que os moradores do Estado passem por este momento sem complicações e problemas mais graves. “O Espírito Santo está para o Brasil, na mesma proporção em que o Brasil está para o mundo. O Brasil passa por um bom momento e tem fundamentos sólidos na economia que o ajudarão a superar mais tranqüilamente este momento de dificuldade mundial”.

Mesmo assim, para o pastor Luciano, os projetos e investimentos das igrejas em especial devem ser revistos, apenas o que for necessário deve ser executado. Entretanto, ele afirma que a conjuntura deve colaborar para que as denominações mudem a maneira como vêem e utilizam o dinheiro. “Algumas igrejas perderam o foco de como investir seu dinheiro. Hoje vemos templos que parecem verdadeiros palácios, onde pobres não entram por vergonha”, disse.

jeferson“Se a crise se avolumar, mais do que nunca a igreja precisará atuar como auxiliadora financeira, emocional e espiritual daqueles que precisarem”
Jeferson Won Rondon de Souza, diretor do Líderes para as Nações

“Talvez a suntuosidade e a opulência não convenham para este momento. A Igreja é uma instituição feita para as pessoas, e não o contrário. Levamos conosco a aparência de que as pessoas nos servem, e não que somos prestadores de serviços como ensino, louvor, direcionamento”, contribuiu Ubirajara Crespo, pastor e proprietário da Editora Naós, completando: “Quem sabe a simplicidade do Evangelho seja alvo de uma retomada de valores e objetivos?”.

Retorno ao princípio

Para colaborar neste caminho de retomada, pastor Luciano acredita que o povo de Deus de hoje precisa retornar para o modelo da igreja primitiva, a qual vivia mais próxima e solidária. “Quando a igreja se voltar para as pessoas e suas necessidades reais, Deus vai abençoar, vai abrir a porta, a cabeça, a inteligência, mostrando soluções”, disse o líder, exemplificando com a parábola da multiplicação dos pães e exortando: “Quando Jesus mandou que os discípulos dividissem os cinco pães e os dois peixes entre a multidão, ele não estava espiritualizando a Palavra; era a ordem. Então, aconteceu o milagre da multiplicação”.

O pastor Ubirajara Crespo experimentará a crise também como empresário, e diz que ela deve ser enfrentada com “criatividade, empenho e fé”. Para ele, neste momento “a indústria das respostas e o comércio de almas, descrito em Apocalipse 18, entrará em erupção vulcânica e se nos calarmos, eles vão faturar, e muito”. “Falo da perfumaria gospel, este tipo de coisa que nos fantasia de crentes, e até mesmo nos marca, mas não transforma nossas vidas e muito menos nos prepara para ‘o dia mal’. Adornos, estatuetas, quadros, pulseiras e bottons. Esta indústria cresce na esteira do costume desta ‘geração gospel’ de se prender ao supérfluo e desprezar o que é essencial”, explicou Ubirajara, e acrescentou: “Talvez a crise venha a revelar a superficialidade cultivada por anos a fio, nos mostrando onde realmente estamos e para aonde precisamos ir”.

De qualquer forma, o pastor Luciano lembra que é preciso “preparar a casa para tempos difíceis”. “O mundo vai melhorar? Não. O mundo vai de mal a pior. Esta pregação dentro da igreja de euforia, de prosperidade, ela tem data de validade, porque o mundo mesmo vai impor uma outra configuração. E esse não é um pensamento negativo, é um pensamento bíblico. A Palavra de Deus diz que quando nós começássemos a ver certas coisas acontecerem, estaria próxima a vinda do Senhor”, enfatizou, dizendo que a crise promoverá uma transformação mundial, não só na economia, mas nas pessoas e nas igrejas, até mesmo nas celebrações. “Um evangelho utilitarista não convém nestas horas, pois Jesus não nos chamou para sermos prósperos, mas para sermos fiéis”, complementou o pastor Ubirajara.

A solução para esta crise, apenas Deus sabe se virá e de onde virá. “Dizem que dois representantes foram enviados para um país distante, visando à implantação de uma fábrica de sapatos. O primeiro, depois de algum tempo, deu a sua opinião: ‘Não vai dar, aqui ninguém usa sapato’. O outro também deu a sua opinião: ‘Vai dar e muito, pois aqui ninguém usa sapato, o que faz com que o mercado se potencialize’. A história fala por si mesma, e Jesus disse que os olhos são a lâmpada do corpo, e se forem maus, todo o corpo será mau. Se olharmos para a crise sob uma perspectiva pessimista, ela nos engolirá”. Este história, contada pelo pastor Ubirajara, mostra que existe uma boa oportunidade para evangelizar os corações feridos por este abalo emocional causado por danos financeiros.

Voltando à história de José, pode-se argumentar que ele teve a revelação divina de algo que ainda iria acontecer. Mas não foi só isso. Ele soube se prevenir para os anos de escassez, armazenando aquilo que ajudaria a superar as dificuldades. É conforme Ubirajara Crespo ensinou: sabedoria, empenho, criatividade e fé para superar este momento de “aperto”. As igrejas e os líderes, se ainda não executam o planejamento financeiro com rigor, precisam encontrar dentro de seus templos pessoas preparadas e capacitadas, com conhecimento, para ajudá-las a administrar este momento, talvez utilizando-o como uma oportunidade de emergir ainda mais firme nas finanças e mais unida na fé.

luciano“Quando a igreja se voltar para as pessoas e suas necessidades reais, Deus vai abençoar, vai abrir a porta, a cabeça, a inteligência, mostrando soluções”
Luciano Estevam Gomes, pastor da Primeira Igreja Batista de Aracruz

O fundamental é não se desviar do alvo, que é Cristo, nem deixar de cumprir o que Deus diz em sua Palavra, que aliás serve de base para caminhar por esta ou qualquer outra crise. Assim como Ele disse ao povo de Israel às vésperas de conquistar a terra de Canaã (Js 1.9): “Esforça-te, e tem bom ânimo; não temas, nem te espantes; porque o Senhor teu Deus é contigo, por onde quer que andares”.

 

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